Arrá!
O GLOBO - 14/05/09
Gostei de saber do fracasso do computador. O meu barato era ver computador ridicularizado. Uma implicância mesquinha, reconheço. Eu a via como um último gesto de resistência à beira da obsolescência. Não podia viver sem o computador, mas minha antipatia crescia com o convívio. O programa de texto que eu usava era à prova de erro ortográfico. O computador não me deixava errar, por mais que eu tentasse. Subvertia o que eu tinha de mais pessoal e enternecedor e sublinhava meus erros com vermelho insolente.
Não era raro eu repetir o erro, para desafiá-lo e mostrar que alguns dos nossos ainda não tinham se intimidado, na esperança de que ele desconfiasse que eu estivesse certo – ou fosse um caso perdido – e retirasse a correção. Nunca aconteceu. Ele não tinha dúvidas da sua superioridade. Ele não tinha nenhum senso de humor. Daí minha alegria ao saber do seu fracasso como tradutor.
Mas agora – arrá! – somos iguais. Com a reforma ortográfica ele se tornou tão obsoleto quanto eu. Ficou ridículo, insistindo em tremas e hífens que não existem mais. Acabou a sua empáfia! E eu serei implacável. Sei que é fácil atualizar o programa de acordo com as novas regras, mas não farei isto imediatamente. Antes quero saborear a minha vingança. E a cada vez que ele sublinhar em vermelho uma palavra minha, direi: “Burro é você! Burro é você!”.
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