Editorial
O ESTADO DE SÃO PAULO - 14/05/09
Diante da eventualidade de o presidente Lula sustar, por pressão dos caciques do partido, o afastamento dos protegidos, Jobim, também ele filiado ao PMDB, deu a entender que renunciaria ao cargo de ministro da Defesa, caso o retrocesso se concretizasse. "Ou temos uma coisa séria ou não temos", declarou. "E, se não for séria, não é ambiente para mim." Jobim é expansivo com as palavras e parece apreciar afirmações bombásticas. Mas, nesse caso, é inegável que pagou para ver. Foi o bastante, de todo modo, para Jucá subir à tribuna para negar que tenha pedido a nomeação dos seus parentes ou a sua reintegração e para protestar contra "a falta de cortesia" com que se deram as demissões, "porque nós, políticos, não podemos entender que a classe política seja motivo (sic) para a demissão de alguém". Cobrou ainda de Jobim que identificasse os autores de eventuais irregularidades na Infraero.
Ficasse nisso, ou em variações ao redor do tema, teria feito a sua parte na defesa da honra dos "injustiçados", embora outros políticos tivessem tentado demovê-lo de falar. Mas a animosidade contra o companheiro de partido o levou a se lixar para as suas atribuições como líder do governo - e para o senso de ridículo. Jucá anunciou a intenção de apresentar emenda constitucional para tornar a chefia do Ministério da Defesa privativa de militares "da ativa ou da reserva", insinuando que estes sim, e Jobim não, entendem do assunto. O disparate é revelador do que a mentalidade predominante na "classe política", como diria o senador, tem de pequeno, quando os seus integrantes querem acertar contas com os seus desafetos. Nessas horas, vêm à tona velhos vícios de conduta, inseparáveis da também viciada relação da maioria dos políticos com o bem público.
A zanga dos peemedebistas com as mudanças na estatal que administra 67 aeroportos e movimenta recursos anuais da ordem de R$ 1,3 bilhão é um de uma infinidade de exemplos de prioridades postas de ponta-cabeça. Primeiro, vem o interesse pessoal. Depois, o interesse partidário. Por fim - e apenas se não colidir com os anteriores, que confluem para a conquista e a perpetuação no poder - entra o interesse da população. Essa inversão de valores fundamenta duas práticas conexas e aparentemente inerradicáveis dos costumes políticos nacionais, na sua vertente mais arcaica: o clientelismo (no relacionamento com os eleitores) e o patrimonialismo (no desfiguramento das fronteiras entre a esfera pública e a particular, como ficou escancarado na sequência de escândalos trazidos à luz no Congresso Nacional).
O loteamento político dos órgãos da administração direta e indireta, em todos os níveis da Federação, é a expressão por excelência das deformidades do sistema de representação no Brasil. O caso da Infraero é característico. Ainda que, por hipótese, fossem modelos de retidão e competência todos quantos puderam ali se empregar, credenciados por seus vínculos familiares, partidários ou de "Q.I." (Quem Indica), o favoritismo no preenchimento de cargos públicos deve ser repelido onde quer que se manifeste. Se não em nome da ética, por ser antítese do princípio da seleção por mérito, indispensável à qualidade dos serviços que o Estado tem o dever de prestar - caso não se lixe para a sociedade que o sustenta.
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