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Diogo Mainardi
14 de maio de 2009
Texto integral
A tortura da CIA e a pergunta de Cheney
O prisioneiro é amarrado a uma prancha, com os olhos tapados e um pano enfiado na boca. Os interrogadores despejam água em seu rosto, sufocando-o. Essa foi uma das técnicas de interrogatório empregadas por agentes da CIA contra os terroristas da Al-Qaeda - a técnica do afogamento. Barack Obama chamou-a de tortura. Nós, os defensores da prática, impenitentes, preferimos chamá-la burocraticamente de "técnica incrementada de interrogatório".
Quem está certo? Barack Obama está certo: é tortura. Uma tortura mansa, dócil, amena, tanto que alguns jornalistas se submeteram espontaneamente a ela. E se um jornalista encara o sofrimento, é sinal de que qualquer um pode encará-lo. Mesmo assim, é tortura. E tortura é sempre imoral. Mas a pergunta repetida insistentemente por Dick Cheney, depois que Barack Obama decidiu divulgar o relatório sobre os episódios de tortura praticados pela CIA, tem de ser respondida: é mais imoral torturar um terrorista ou permitir um atentado? Porque esse é o melhor argumento usado por Dick Cheney. Ele garante que a técnica do afogamento salvou vidas, impedindo uma nova série de atentados nos Estados Unidos, nos mesmos moldes dos ataques de 11 de setembro de 2001. Ele garante também que a prova desse fato está contida nos documentos da CIA que Barack Obama, até agora, preferiu omitir, mantendo o sigilo.
O que se sabe com certeza é que Khalid Shaikh Mohammed, acusado de ser o organizador dos atentados de 11 de setembro, foi capturado nos primeiros meses de 2003, numa cidade paquistanesa. Interrogado sobre os planos da Al-Qaeda para novos atentados terroristas nos Estados Unidos, ele se limitou a dizer: "Esperem para ver". Em vez de esperar para ver, a CIA torturou-o com a técnica do afogamento. Sim: 183 vezes. Sim: deu resultado. Depois de alguns dias, Khalid Shaikh Mohammed dedurou um terrorista conhecido como Hambali, cuja captura permitiu o desmonte de uma célula composta por 17 membros da Jemmah Islamiyah, que tinha planos para realizar uma "Segunda Onda" de atentados contra os Estados Unidos, na Costa Oeste. Quantas vidas foram salvas com isso? É o que os documentos da CIA podem ajudar a esclarecer.
Os interrogadores da CIA foram comparados aos torturadores de Pol Pot. Do mesmo modo que a guerra no Iraque foi comparada às Cruzadas, Gaza foi comparada ao gueto de Varsóvia e a crise financeira do ano passado foi comparada à de 1929. Nós estamos numa era de embustes históricos, usados para camuflar a propaganda eleitoreira. É perturbador admitir que a tortura, aplicada de maneira limitada - contra Khalid Shaikh Mohammed e outros dois terroristas -, num período igualmente limitado - nos meses posteriores aos atentados de 11 de setembro de 2001 -, possa ter contribuído para salvar centenas de pessoas. Mas os fatos perturbadores precisam ser questionados sem medo, mesmo que a resposta contrarie tudo aquilo em que sempre acreditamos. O erro é "esperar para ver". Ninguém deve esperar para ver.
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