O programa de privatizações do governo Temer frustrou quem esperava algo mais potente e ambicioso direcionado a arrecadar uma bolada de receita extra orçamentária e derrubar boa parte dos R$ 139 bilhões de déficit fiscal esperado para 2017. Mas será que privatizações devem servir prioritariamente a essa finalidade? Há quem discorde e tenha bons argumentos. De qualquer forma, a relação de ativos e concessões ofertados quase não trouxe novidades em relação aos cogitados pelo governo anterior. São portos, aeroportos, ferrovias, rodovias, ativos do setor elétrico e áreas de petróleo, que já figuravam nos escaninhos de Dilma Rousseff.
A novidade está nos detalhes, na revogação de certas condições impostas pela ex-presidente que ou afugentavam investidores ou criavam encrencas futuras para os que se aventurassem a aceitá-las. Por exemplo, tabelar lucro e entregar uma rodovia a quem oferecesse tarifa de pedágio mais baixa. Resultado: com o caixa vazio, o concessionário não investia em obras de ampliação e melhorias da rodovia e ainda corria ao BNDES em busca de crédito subsidiado. Foi o mesmo princípio aplicado à queda forçada da tarifa de energia elétrica em 2013, que destroçou a Eletrobrás, desorganizou todo o setor elétrico e restou superada pelo grande tarifaço de 2015, com efeitos perversos para a inflação e o bolso dos brasileiros. Essas ideias nasciam da cabeça teimosa de Dilma Rousseff, resistente em aceitar regras básicas das leis de mercado, que ela deveria ter aprendido no curso de Economia.
Felizmente, o programa não ficou só na mesmice. Trouxe uma positiva surpresa, que promete pagar uma dívida social com mais da metade da população que sofre doenças ou morre por ficar exposta à água contaminada e esgoto a céu aberto. No sertão do Nordeste, na zona rural pobre da Amazônia ou nas palafitas de grandes cidades, pouco ou nada há de estrutura de saneamento básico. Dados oficiais mostram que só 44,5% da população do País está conectada com a rede de esgoto e, do esgoto coletado, só 40% são tratados. A situação é mais dramática nos Estados mais pobres. No Maranhão só 1,4% dos municípios faz tratamento de esgoto; no Piauí, 2,2%; e em Rondônia, 3,8%. Esses números mostram nosso vergonhoso atraso numa área tão fundamental para a saúde humana.
A presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos, anunciou que vai se reunir com governadores interessados em conceder direitos ou em privatizar suas empresas. Além de ser a única forma de levar investimentos para seus Estados nessa área, os governadores se sentem estimulados pela chance que têm de aliviar sua precária situação financeira com a receita das privatizações. Como aconteceu no governo FHC com as distribuidoras estaduais de energia elétrica. Três deles – Rio de Janeiro, Rondônia e Pará – já iniciaram entendimentos com o banco e suas empresas devem ir a leilão no primeiro semestre de 2018. Esperam-se outras adesões, e com elas o fantasma da privatização e sua exploração política oportunista vão se dissipando.
Sem a presença das grandes empreiteiras e dos maiores fundos de pensão das estatais, que desde FHC tiveram papel fundamental como investidores, o governo vai enfrentar agora um cenário novo e desconhecido na busca de novos empreendedores. Uma alternativa é buscá-los no exterior. É com esse fim que Michel Temer irá a Nova York, na quarta-feira, vender o programa de privatização para grandes players e investidores norte-americanos. Eles virão? Tal decisão não depende apenas da atratividade do negócio, da qualidade das regras de editais e licitações ou da firmeza dos contratos. Depende também – e muito – da percepção de confiança no governo e seus parceiros políticos no Congresso, da real disposição de levar adiante (e sem recuos) a agenda de reformas, do reequilíbrio fiscal e fazer das agências reguladoras instituições com qualidade técnica, despolitizadas, que atuem com autonomia, com respeito às decisões do governo, mas sem sua interferência para cumpri-las. E no campo da confiança o governo vem perdendo o jogo.
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