O ESTADO DE S.PAULO - 04/07
Incomodado, o Planalto usa de todos os meios para tentar conter a repercussão das denúncias envolvendo a Petrobrás e abusa de sua maioria no Congresso para barrar qualquer investigação mais séria sobre a estatal nas duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) - a do Senado e a mista -, cujo desenrolar é um contínuo atropelo da transparência, como se viu nas sessões de quarta-feira.
A Constituição estabelece que, para a instauração de uma CPI, basta que a proposta tenha o apoio de um terço de uma Casa legislativa. É um mecanismo para evitar que a maioria bloqueie investigações de interesse público. Foi com base nesse dispositivo que, em abril, o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de decisão liminar, determinou que o campo de investigação da CPI da Petrobrás fosse "apenas" as denúncias relativas à estatal de 2005 a 2014, conforme proposta de senadores da oposição.
A decisão do STF parecia pôr fim a uma batalha política, na qual o Planalto tentava de todas as formas bloquear uma investigação mais profunda sobre as denúncias envolvendo a Petrobrás durante os governos Lula e Dilma. Sob o argumento de que a oposição tinha apenas intenções políticas com a CPI, o Planalto pretendia fazer o mesmo, incluindo no campo de investigação da CPI outros casos, sem nenhuma conexão com as denúncias contra a Petrobrás, mas que envolvessem governos da oposição. Aplicava a máxima de que a melhor defesa é o ataque.
No entanto, o STF decidiu que a tentativa de inflar a CPI, com assuntos estranhos à proposta original, feria o direito previsto na Constituição de uma minoria instalar uma CPI, desde que respeite as regras para esse caso. Com a decisão, a CPI teria como objeto principal três denúncias contra a Petrobrás: suspeitas de superfaturamento e evasão de divisas na compra da Refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos; indícios de superfaturamento na construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco; e indícios de pagamento de propina pela companhia holandesa SBM Offshore a funcionários da estatal.
O Planalto, entretanto, não se deu por vencido. Com maioria para dominar as duas CPIs criadas, esvaziou-as completamente. Ao invés de âmbitos de investigação, transformou-as em sessões de amigáveis (e intermináveis) entrevistas, de modo que nenhum dano lhe fosse causado. Já passaram pelas CPIs Paulo Roberto Costa - que um dia após um depoimento absolutamente morno (e satisfatório aos governistas) voltou a ser preso pela Polícia Federal -, Nestor Cerveró - que vem fazendo uma ginástica hercúlea para não se indispor com Dilma e ao mesmo tempo salvar a sua pele - e Graça Foster. A esta o relator Marco Maia (PT-RS) fez nada menos do que 70 "perguntas", impedindo que fosse ouvida qualquer novidade.
O episódio mais recente foi a omissão de qualquer referência à compra da refinaria em Pasadena durante a sessão de perguntas à diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Magda Chambriard, na quarta-feira, na CPI do Senado. E não se pode dizer que o assunto estava esquecido: no mesmo dia, o Estado havia revelado pareceres do Tribunal de Contas da União (TCU) que apontam os equívocos da compra da refinaria americana e mostram ser insustentável a tese governista de que foi um "bom negócio".
Por essa razão, os aliados do Planalto estão tramando, conforme revelou reportagem do Estado, incluir mais um tema na CPI: a operação entre a Petrobrás e a empresa ibero-argentina Repsol YPF, realizada em 2001, no governo FHC, quando José Jorge, atualmente ministro do TCU e relator do caso Pasadena, era ministro de Minas e Energia e presidente do Conselho de Administração da Petrobrás. Encontraram um caso para tentar diminuir o impacto das denúncias de irregularidades ao longo dos governos Lula e Dilma. No entanto, o negócio entre Petrobrás e Repsol YPF já está na Justiça, e os réus foram absolvidos em maio de 2005, havendo atualmente apenas um recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O Planalto abusa da sua maioria no Congresso, impondo o que deseja, ainda que à revelia de legítimas decisões da Justiça. Acha-se no direito de fazer o que bem entende no Legislativo. Não poderá reclamar se, nas urnas, o eleitor também fizer o que bem entender.
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