VALOR ECONÔMICO - 10/04
Sem nada explicar, governo mudou o que tinha anunciado antes
No dia 4 de abril, a Secretaria do Tesouro Nacional encaminhou o ofício nº 2 COAPI/SUPOF/STN/MF-DF à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), formalizando a intenção de fazer um aporte adicional de R$ 4 bilhões, dos quais R$ 1,2 bilhão seria destinado ao pagamento das despesas com as termelétricas em janeiro de 2014 e os outros R$ 2,8 bilhões destinados às "despesas ordinárias" da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Ou seja, sem qualquer explicação ao público, a STN mudou o que tinha sido anunciado anteriormente pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pelo próprio secretário do Tesouro, Arno Augustin, durante entrevista coletiva, no dia 13 de março.
Não houve explicação do governo para essa mudança, mas não é difícil entendê-la. O aporte adicional de R$ 2,8 bilhões do Tesouro será utilizado para "despesas ordinárias" da CDE, que são aquelas relacionadas com a indenização dos ativos por ocasião da reversão das concessões, a compensação do efeito decorrente da não adesão à prorrogação das concessões de geração de energia elétrica, a compensação dos descontos tarifários aplicados aos usuários dos serviços públicos de energia, as despesas do programa Luz para Todos e o subsídio da tarifa social, entre outras. Antes, o Tesouro já tinha colocado R$ 9 bilhões para cobrir esses gastos. No total, os recursos do Tesouro neste ano para a CDE pagar "despesas ordinárias" serão de R$ 11,8 bilhões (R$ 9 bilhões mais R$ 2,8 bilhões).
Em fevereiro deste ano, a Aneel estimou todas as receitas e despesas do setor elétrico, considerando o déficit de 2013, concluindo que faltava R$ 5,6 bilhões para fechar as contas de 2014. Este foi o valor encontrado para a quota anual (chamada tecnicamente de "quota CDE") a ser rateada entre as distribuidoras. A Aneel informou que esse valor implicava aumento médio de aproximadamente 4,6% nas tarifas de energia elétrica neste ano para os consumidores finais e os usuários do sistema de distribuição de energia elétrica.
O aumento seria adicional aos reajustes anuais previamente definidos em contratos da Aneel com as distribuidoras, que levam em conta a variação do IGP-M e o impacto do câmbio sobre a energia comprada de Itaipu, entre outros fatores.
Essa proposta da Aneel de aumento adicional de 4,6%, com o respectivo rateio entre as distribuidoras, foi submetida à audiência pública. É importante observar que esse cálculo da Aneel partiu do pressuposto de que não haverá elevação da tarifa de energia elétrica neste ano para começar a repor parte dos R$ 9,8 bilhões gastos pela CDE, com recursos do Tesouro, com o acionamento das termelétricas em 2013. Decreto da presidente Dilma Rousseff havia definido o prazo de cinco anos para que esses recursos fossem recolhidos à CDE por meio de elevação das tarifas dos consumidores. Achava-se, inicialmente, que essa reposição começaria em 2014. O adiamento foi anunciado pela Aneel em fevereiro.
Para evitar esse aumento adicional de 4,6%, o governo decidiu mudar as medidas anunciadas em 13 de março. Dos R$ 4 bilhões que tinha reservado para cobrir os gastos com as térmicas, destinou R$ 2,8 bilhões para reforçar o caixa da CDE. Com o novo aporte do Tesouro e outras alterações em receitas e despesas, o balanço da Aneel resultou na necessidade de R$ 1,6 bilhão para fechar as contas deste ano. Esse é o valor da quota que será rateada com as distribuidoras e resultará em aumento adicional de tarifa aos consumidores em torno de 1% e não mais de 4,6%.
A mudança no jogo foi feita pelo governo, portanto, para evitar uma elevação mais forte das tarifas de energia neste ano, que é de eleições gerais. Mesmo com isso, nesta semana, a Aneel autorizou aumento de 14,24% na conta de luz para os consumidores residenciais da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), que atende 7,7 milhões de residências. O reajuste para os clientes residenciais da CPFL Paulista, que atende 3,9 milhões de consumidores, foi de 16,46%. Os reajustes das demais distribuidoras ocorrerão ao longo deste ano e todos serão na casa de dois dígitos.
O custo pelo acionamento das térmicas em 2013 e 2014 será coberto, portanto, pelo aumento das tarifas em 2015 e nos anos seguintes. Há, no entanto, uma questão extremamente séria que precisa ser considerada nesta equação. A escassez de chuvas, bem abaixo da média histórica, e a decisão do governo de não adotar medidas de diminuição do consumo, mesmo que para estimular a redução voluntária do consumo, pode deixar os reservatórios em níveis excessivamente baixos.
O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) admitiu, em reunião com associações do setor, que o seu cenário padrão para este ano contemplava a queda dos reservatórios nas regiões Sudeste e Centro-Oeste para 15,5% da capacidade. Se isto vier a ocorrer será o menor nível já registrado na história e muito perto do que os técnicos do setor definem como "operação kamikaze" - quando se chega a níveis próximos de 10% da capacidade é preciso mais água para mover as turbinas e gerar a mesma quantidade de energia.
Com isso, a operação do sistema fica mais vulnerável a blecautes imprevistos e prolongados. Este quadro projeta também para 2015 a necessidade de manter as termelétricas ligadas a plena carga, permanentemente, com novos custos bilionários a serem repassados aos consumidores.
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