O GLOBO - 13/02
Por enquanto, há o discurso a favor da austeridade, que precisa ser aplicado na vida real. Mas, se não retomar a agenda das reformas, o Brasil ficará à margem no mundo
Até anteontem, a inclusão do Brasil no chamado grupo dos “Cinco Frágeis”, ao lado de Índia, Turquia, Indonésia e África do Sul, poderia ser tachada de “terrorismo psicológico” praticado por analistas neoliberais do mercado financeiro. Ora, se há fuga de divisas do país com a virada de chave da política monetária americana, outros, e não apenas estes quatro “frágeis”, também padecem do mesmo mal e consequentes desvalorizações cambiais. Mas, na terça feira, Brasil e seus companheiros de infortúnio econômico apareceram mencionados, nesta condição, no relatório semestral do Federal Reserve, Fed, o banco central americano. Já sob a presidência de Janet Yellen, o BC dos Estados Unidos reconhece formalmente a maior vulnerabilidade destas cinco economias diante da função semelhante à de um gigantesco aspirador de pó que passou a ter a economia americana, com a perspectiva de elevação dos juros em Wall Street.
A já enorme atratividade dos títulos do Tesouro americano passou a aumentar, em meados de 2013, quando o então presidente do Fed, Ben Bernanke, mencionou que chegaria o momento em que a autoridade monetária americana começaria a reduzir a política de relaxamento monetário (recompras bilionárias de títulos e hipotecas), lançada para acelerar a retomada da economia.
Isso vem acontecendo e, para evitar futuro surto de inflação e novo ciclo de bolhas especulativas, o Fed passou a recomprar menos papéis, na contagem regressiva para a primeira elevação de juros desde 2008. E como mercados atuam nas expectativas, desde o ano passado o fluxo financeiro mundial tomou o rumo preferencial dos Estados Unidos, depois de se aproveitar das altas taxas de retorno em mercados emergentes como o brasileiro. Se os títulos do Tesouro americano são imbatíveis no quesito segurança, também passam a ser mais rentáveis, e segurança e rentabilidade são mistura irresistível para qualquer investidor.
O Brasil perde tempo. O atual discurso de austeridade fiscal chega com algum atraso. Mas, se for aplicado na prática, pode recuperar algum tempo perdido. Porém, ainda falta muito para a adaptação do país a um mundo mais “normal”, com o dólar mais forte, devido à recuperação americana.
O ex-ministro Delfim Netto, em colunas no “Valor” e em recente entrevista à “Folha de S.Paulo” bate na tecla de que o mau humor com o Brasil não tem muito lastro na realidade. A inflação é alta, mas nada indica que escapará ao controle. O déficit em conta corrente, de mais de 3% do PIB, não é saudável, porém a desvalorização do real pode ajudar a recuperar exportações. É certo.
Mas mesmo Delfim reconhece que o Brasil precisa voltar às reformas. Na agenda, estão a previdenciária, a trabalhista, entre outras. Não será em ano eleitoral que esta pauta será lançada. Mas, em 2015, seja qual for o presidente, o tema se imporá por si mesmo. Disso dependerá a perpetuação ou não do Brasil em listas de países fragilizados.
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