O GLOBO - 13/02
Quanto mais países bolivarianos ingressarem no bloco, mais problemas operacionais vão se tornar insolúveis
O questionamento é do presidente do Uruguai, que, reiteradas vezes, tem chamado a atenção para a necessidade de o bloco realizar um ajustamento jurídico-institucional que está esgotado em sua essência. Torna-se cada vez mais impossível compatibilizar os distintos problemas internos de cada país membro com os compromissos comunitários assumidos.
Mais recentemente, o ex-ministro da Economia da Colômbia chamou a atenção para a crescente discrepância entre seus membros para resolver o imbróglio jurídico sobre a suspensão temporária do Paraguai, o cumprimento das obrigações venezuelanas contidas no Protocolo de Adesão, a provável interação da Bolívia e talvez do Equador. Em termos práticos significa dizer que, quanto mais países bolivarianos ingressarem no Mercosul, mais problemas operacionais tornar-se-ão insolúveis, anunciando um porvir desanimador.
Esses desencontros causaram o adiamento, por três vezes, da reunião semestral de cúpula que se realizaria em dezembro passado, remarcada para 17 e 31 deste mês e novamente adiada para fevereiro próximo. Tampouco sem uma clara definição de qual país assumirá a presidência pró-tempore. O Paraguai já declarou que voltará ao Mercosul, mas não assumirá sua coordenação, que caberá, pelo rodízio estabelecido, à Argentina, justamente o país que não consegue apresentar uma oferta em bens à União Europeia compatível com as apresentadas pelos demais sócios (sem presença da Venezuela), além de não arredar um milímetro dos controles administrativos às importações de qualquer origem. Com que credibilidade aquele país exercerá tal coordenação?
Por todas essa razões, volta à baila a hipótese de o Mercosul retroceder à formação de uma área de livre comércio em termos estritos de liberalização tarifária, uma vez que a liberalização comercial, principalmente nos últimos anos, tornou-se mera peça de retórica. Os que defendem a tese estribam-se na necessidade de o Brasil alçar voos solos nas relações internacionais com áreas mais desenvolvidas. Apenas como hipótese tal arranjo implicaria numa revisão da atual Tarifa Externa Comum, a qual retrocederia a cinco novas tarifas nacionais criando, consequentemente, margens preferenciais distintas entre os países membros. Tal manobra, se viável, também implicaria numa ampla revisão da Decisão CMC 32/2000, que obriga a negociações conjuntas do bloco com terceiros países. Num recente seminário tal questão foi levantada como impraticável, mas fortes opiniões advogaram a tese de que, quando conveniente, o Brasil tomará uma decisão reformadora independente.
Cabe então a pergunta: em que governo? No atual panorama político dos três maiores países do bloco não se praticam políticas de Estado, mas sim políticas de poder e, a menos que os quadros eleitorais no Brasil e na Argentina se alterem substancialmente, tudo ficará “como dantes no quartel de Abrantes”.
No exterior, atribui-se ao Brasil não só a capacidade, mas também o dever, de liderar um processo reformador no Mercosul “se desejar salvá-lo da irrelevância”, na expressão do colunista colombiano. Mas, nas esferas palacianas de Brasília, não é essa a visão dos estrategistas. Muito pelo contrário, qualquer ação reformista na esfera regional corre o risco de perder o poder hegemônico bolivariano que conduz a política externa dos países do leste sul-americano com a honrosa exceção do Uruguai. Nesse andor, teremos apenas durante mais alguns anos múltiplas peças discursivas plenas de demagogia e vazias de praticidades. A integração sub-regional está marchando para um impasse de sérias proporções irreversíveis caso não sobrevenha um choque de realismo.
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