CORREIO BRAZILIENSE - 01/02
Este verão absurdamente quente revelou mistérios. Os black blocs, por exemplo, ficaram sozinhos quebrando vidraças, agências bancárias e lojas de automóveis. Eles perderam o apoio da população, que se voltou para os rolezinhos dos adolescentes em férias. E rapidamente foram produzidas diversas teorias quase tão profundas quanto as da Escola de Frankfurt para explicar o fenômeno.
O problema de 2014 é o verão. A presidente Dilma fugiu para o frio de Davos, na Suíça, onde tentou explicar os caminhos da economia brasileira. Se foi feliz, não sei. Os jornais ingleses dizem que o Brasil foi o perdedor naquele conclave. O vencedor teria sido o México, que anunciou novos grandes investimentos e inauguração de indústrias. E, claro, a cereja do bolo, que foi a privatização da Pemex, o que abre nova perspectiva para o capital estrangeiro nas generosas jazidas localizadas no Golfo do México.
A canícula está por aí, fazendo vítimas. Nas últimas semanas, Porto Alegre teve temperatura mais elevada que Manaus. Belém está uma beleza, em torno dos 25 graus centígrados, muito diferente do forno carioca, cuja sensação térmica chega a 50 graus, o que faz o preço do coco gelado, à beira da praia, alcançar R$ 6. Era R$ 1 há coisa de um ano. E haja passeata. Contra tudo e contra todos. Todo mundo protesta.
Os políticos estão dispersos pelo planeta. Vão começar a chegar a Brasília na próxima semana. A partir daí, os problemas serão mais objetivos e concretos. É a reforma ministerial que já se iniciou e ainda vai se desdobrar em sofridos capítulos até o fim de fevereiro. Não esquecer que o carnaval, neste ano, cai na primeira semana de março. Depois do tríduo momesco, o país deveria estar pronto para funcionar. Difícil. A presidente estará cercada pelos parlamentares que desejam cargos e verbas e por descontentes que vão pulular em todos os estados.
Sorte que o calor deverá estar mais ameno. Os assuntos serão mais sérios. A composição da aliança PT e PMDB é difícil em toda sua extensão. Nos estados e na União. No Rio, a situação é de conflito aberto. Além deles, os demais partidos políticos que deveriam estar unidos em torno da candidatura Dilma Rousseff manifestam insatisfações de todos os tipos. É impossível contentar a todos. Nem o carisma do ex-presidente Lula consegue acalmar a turma. Haverá dissidências.
O que importa é que o verão está terminando. A presidente parou em Lisboa e mandou uma bacalhoada. Ela diz que cada um pagou a sua comida. Bom argumento. Parece que bastava encher o tanque do avião e seguir viagem. Não era necessário fazer a escala. Mas a caminho de Cuba e do calor de Havana, faz sentido descansar e desfrutar de bom vinho português. Enfrentar os irmãos Castro, que mandam na ilha há 50 anos, não é fácil para ninguém.
E ainda inaugurar um porto como de Mariel, que será o maior do Caribe. Todo construído por empresas brasileiras, fornecedores brasileiros, técnicos brasileiros e dinheiro brasileiro. A questão é qual será a utilização a ser dada pelos cubanos para tamanha instalação. Cuba não produz nada além de açúcar e charutos. O espaço parece ser construído sob medida para utilização dos chineses. Pode vir a ser um grande entreposto da carga que, vindo pelo Canal do Panamá, vá ser armazenada ou beneficiada ali. Destino: América.
A crise da economia argentina é muita séria. Crise cambial, ensinava Mário Henrique Simonsen, derruba governos. E os nossos vizinhos estão com o caixa baixíssimo. O povo lá está batendo panela dia e noite. O calor em Buenos Aires está de rachar catedrais. Se os hermanos falirem, lá se vai um dos principais compradores de produtos industrializados brasileiros. O outro é a Venezuela, que, embora milionária em petróleo, comprometeu sua renda jogando dinheiro pela janela. Falta até papel higiênico. O presidente Maduro reza por Chávez todas as noites, mas o milagre não acontece.
A América Latina é fantástica. O verão de 2014, quentíssimo, ficará na memória como o momento das grandes loucuras - financeiras, econômicas, políticas e futebolísticas. Mas, em Brasília, que também fez calor, as pessoas estão em situação de expectativa. Muita água ainda vai correr debaixo da ponte da política antes das eleições. O resultado da Copa vai interferir na eleição. A cotação do dólar, que não para de subir, também. E a inflação vai incomodar. América Latina é surrealista em qualquer tempo. No verão escaldante é ainda mais imprevisível.
Nenhum comentário:
Postar um comentário