O GLOBO - 29/01
Há um problema extra no setor de energia. As distribuidoras não conseguiram contratar toda a eletricidade que elas têm que entregar aos seus consumidores. Não é falta de energia ou possibilidade de apagão. O risco é de preço alto. Ao todo, elas estão com uma falta de 4.000 MWH. Tem que comprar no mercado à vista e o preço disparou. Custa hoje quase o dobro do que na média do ano passado.
Houve alguns dias de chuvas fortes nas grandes cidades do Sudeste. Quem viu a tempestade achou que, pelo menos, um problema estava afastado. Não está. Tanto a subcontratação quanto o uso das térmicas aumentarão o custo. Para não bater na conta do consumidor, terá que aumentar a conta do contribuinte.
A confusão foi a seguinte: pelo mecanismo de leilão, feito pela EPE, as distribuidoras contratam a energia que têm que fornecer aos seus consumidores. Quando não têm tudo, precisam ir ao mercado spot e comprar. O problema é que, na segunda-feira, o preço estava em R$ 484 o megawatt hora. No ano passado, o preço médio foi de R$ 263 o MWH.
Energia existe no sistema. O mecanismo de leilões falhou porque o preço máximo estabelecido pela EPE foi baixo demais. Alguns leilões “deram vazio", como se diz no setor: não apareceu oferta. Se toda essa energia tiver que ser comprada no mercado livre ao preço de segunda-feira, significa R$ 1,4 bilhão por mês.
Especialistas do mercado de energia dizem que, na hora de fazer os leilões no fim do ano passado, a EPE fixou um preço máximo baixo demais, de R$161, e aí ninguém ofertou energia a esse preço. Mais tarde elevou para R$ 193 o Megawatt hora. E apareceu oferta de 2.500 MWH. Mesmo assim, ficou faltando.
— Quando as distribuidoras estão subcontratadas como agora, não quer dizer que faltará energia, mas elas terão que comprar no mercado spot e isso eleva o custo que, pela lei, teria que ser repassado para o consumidor. Teremos dificuldade de carregar esse custo até ele ser remunerado — disse um empresário do setor.
Por isso o governo teria que agir para evitar esse estrangulamento. Por essa conta gráfica, se toda energia tiver que ser comprada no mercado à vista, vai aumentar o preço da eletricidade. Ou terá que haver mais transferências do Tesouro para cobrir os desequilíbrios financeiros do sistema.
Esse problema se soma a outro que também encarecerá a energia: o nível dos reservatórios. No Sudeste e Centro-Oeste, os reservatórios estão com 41,5% e eles são os mais importantes para abastecimento de energia do país. No Nordeste, o nível está em 42%; no Sul, 63% e no Norte, 57%. Já houve situações piores, como a do começo do ano passado, e o mercado não prevê risco de racionamento. Mas isso significa mais uso de térmicas, que elevará o custo. No ano passado, essa diferença entre custo e preço impactou o Tesouro em R$ 10 bilhões; para 2014, estão previstos no Orçamento R$ 9 bilhões.
— E pensar que nós estamos em pleno verão, época em que, normalmente, estaria vertendo água nos reservatórios — disse um empresário.
O problema foi a tentativa de realizar leilões com o preço máximo abaixo do que o mercado estava disposto a vender a oferta. Não deu certo e a situação acabou ficando assim: o país entra na estação chuvosa com os reservatórios com um nível baixo e com desequilíbrio de energia contratada.
O divórcio entre custo e preço está criando um ambiente mais artificial, com um subsídio cada vez maior. As empresas distribuidoras reclamam que não têm caixa para carregar o prejuízo até serem ressarcidas; o governo decidiu pagar o subsídio que for para manter a ficção do marketing político de que reduziu o preço da energia. O consumidor é poupado; e o contribuinte, onerado.
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