O GLOBO - 26/11
Como todos concordam que não existe jantar livre, como financiar tal programa? Participação compulsória, coparticipação, aumento de impostos
Apresidente Dilma poderia criar um programa que iria catapultá-la de mãe do PAC a mãe do povo brasileiro. Seria um programa em que cada brasileiro adulto ou adolescente compraria uma cartela com 12 vales-jantar cada ano, usando-os para jantar fora de casa.
O setor de alimentação fora de casa é o maior empregador do Brasil, oferecendo empregos flexíveis para os que mais precisam — jovens com baixa qualificação. Seriam criados três milhões de novos empregos.
Restaurantes são enormes e visíveis exemplos de desigualdade e exclusão. Com o “Dilmajantar”, é possível vislumbrar um especial de TV filmando uma família inteira entrando num lindo restaurante pela primeira vez. O programa educaria os brasileiros sobre alimentação e comportamentos saudáveis. Nada de fast food, muita comida local; nada de más gorduras, muita sustentabilidade.
Tal programa teria que ser compulsório. E regulamentado. Preços controlados. Vales com valor máximo, com multa para os excessos. Vales com valor mínimo garantiriam refeições de qualidade básica, explicaria o governo. Multas aos não compradores dos vales.
E os de menor renda? As empresas com mais de 50 empregados comprariam os vales para empregados (e familiares) que ganhassem entre dois e 15 salários, com coparticipação. Despesa tributável para empresas, renda não tributável para trabalhadores. E os com menos de dois salários ou trabalhando em empresas com menos de 50 empregados receberiam a cartela do governo.
Como todos concordam que não existe jantar livre, como financiar tal programa? Participação compulsória, coparticipação, aumento de impostos, menores despesas com saúde pública, renúncia fiscal, coerção. A conta até fecha no início, ajudada pelos subsídios escondidos. Quem só come salada financia os comedores de filé. Quem come pouco financia quem come muito. No médio prazo, chega o déficit público, talvez financiável pelos chineses. Consumidores, trabalhadores, burocratas, empresários nunca se comportam dentro das premissas de tais planos. Ninguém combina com os russos, diria Garrincha.
Será que políticos fazem tal macarronada? Fazem, acima é o Obamacare, a tentativa de universalizar o sistema híbrido de saúde dos EUA, que começou torto 80 anos atrás. Mexeu Obama com os interesses de entrincheirados médicos, advogados, hospitais, sindicatos, gerenciadores de planos de saúde, reguladores, fiscalizadores, indústria farmacêutica, seguradoras, ONGs? Nem tentou. Isso num país rico, de democracia estabelecida, o único país do mundo em que a oferta de saúde é maior que a demanda interna. E o Obamacare foi desenvolvido por gente preparada e inteligente, que acredita que problemas sociais se resolvem com vontade política e inteligência aplicada.
O que se vê em programas tipo “Dilmajantar” é apoio de usuários de antolhos morais e de oportunistas, falando de dicotomias como mercado x estado, lucro x social e outros engodos. O programa decola, escondendo quem paga a conta, a população. Aumenta muito o atrito social, ignorando que a natureza da firma é exatamente o contrário, segundo Ronald Coase.
O mais sofisticado programa de engenharia social é singelo frente à realidade. Talvez possa isolar os piratas, criar burocratas neutros, evitar incentivos adversos como o corporativismo. Mas como conter free riders, rent seekers, a captura dos reguladores? E a natureza das pessoas, cujas preferências são subjetivas e o conhecimento, muito disperso? E contra os legais furos inerentes a tais programas, desenvolveríamos uma Justiça que leria mentes e julgaria intenções?
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