O Estado de S.Paulo - 26/11
O Banco do Nordeste tem promovido estudos sobre as perspectivas de desenvolvimento do Nordeste que revelam que a economia regional está em movimento. Sob coordenação de Tania Bacelar e Leonardo Guimarães, possivelmente os economistas na ativa que melhor conhecem o Nordeste, os resultados preliminares indicam que a "região-problema" aos poucos se transforma numa "região com problemas", os mesmos que afligem o País como um todo, embora com intensidade muito mais elevada. Apesar da persistência das disparidades regionais e da concentração da pobreza no Nordeste, já não é possível esconder, nem para manter o justificado e necessário tratamento especial que a região recebe, os novos Nordestes dinâmicos que estão emergindo e que, em muitos casos, já são realidade.
O professor Gustavo Maia Gomes, da UFPE, sintetiza as principais transformações econômicas. Enquanto a agricultura dos cerrados e os polos de irrigação recolocaram a região no mapa do agronegócio brasileiro, a grande indústria regional - simbolizada nas fábricas de automóveis, estaleiros, siderúrgicas e refinarias em construção ou projetadas - está renascendo. Após séculos de concentração no litoral, o dinamismo está atravessando os agrestes e desbravando os sertões, onde cidades de médio porte, povoadas por pequenas e médias empresas, vão se consolidando como hub de negócios que atraem e absorvem a população local que antes migrava para as capitais.
Em muitas cidades do semiárido o setor serviço está se modernizando, puxado pela construção de centros comerciais, expansão da rede de ensino superior e consolidação de polos médicos, entre outras atividades. Novos projetos de mineração estão em curso e têm potencial para movimentar economias locais estagnadas e sem perspectivas. É provável que, em poucos anos, a fotografia do semiárido seja um campo de torres de geração de energia eólica, que se espalham em todos os Estados, com grande potencial de crescimento. Analisados em conjunto, pode-se afirmar, sem incorrer no exagero propagandístico dos governos, que a economia nordestina está sendo revolucionada. Maia Gomes considera que "metade dessa renovação se deve à chegada do capitalismo ao Nordeste e que a outra metade é obra do Estado. Neste caso, os dois não brigam, mas se complementam".
Também não é possível esconder o Nordeste que resiste às mudanças, representado por parte do setor sucroalcooleiro, pelos latifúndios e minifúndios do semiárido, pelo empreguismo público e pelas muitas famílias pobres que vivem das transferências governamentais e compõem a "economia sem produção", no dizer de Maia Gomes. Para ele, "metade dessa mesmice se deve à falta de capitalismo e a outra metade é obra do Estado, que protege os ineficientes e considera a questão social um caso de esmolas. Os governos do bem e os empresários da boquinha não são inimigos. São sócios".
Um dos principais gargalos é a precariedade da infraestrutura, que no Nordeste é ainda mais indigente do que nas demais regiões do País (exceto a Norte). Há anos o governo vem anunciando grandes investimentos em infraestrutura, que deveriam equacionar as deficiências e pôr o País em condições de igualdade para competir com o resto do mundo. Não se discute a extrema relevância das obras em curso para a economia regional, mas Maia Gomes estima que o investimento anual em infraestrutura no Nordeste é pouco mais da metade do que seria necessário, o equivalente a 6% do PIB por ano para manter o projeto de crescimento da região. Segundo ele, "é realmente menos do que muito pouco".
Não parece haver dúvidas sobre qual Nordeste prevalecerá, mas não se pode dar por descontado que o atual ciclo de crescimento se sustente sem ajustes importantes na política pública. A mudança de postura do governo federal em relação à privatização de serviços, construção e operação de infraestrutura é, sem dúvida, a maior novidade e fator de otimismo de que o movimento pode continuar. Mas tiro no pé parece ser um dos esportes preferidos de Brasília. Fiquem atentos!
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