quarta-feira, novembro 13, 2013

Aumentam chances de tempestade perfeita - CRISTIANO ROMERO

VALOR ECONÔMICO - 13/11

A possibilidade de o Brasil sofrer os efeitos de uma tempestade perfeita nos próximos meses aumentou de forma significativa nas últimas semanas. Essa tempestade seria consequência da combinação do início da redução dos estímulos monetários nos Estados Unidos e do rebaixamento da classificação de risco da dívida brasileira.

No primeiro caso, não há o que fazer. O Federal Reserve Bank (Fed), o banco central americano, sinalizou em setembro que poderia começar o corte de estímulos no primeiro trimestre de 2014. A decisão esteve sempre condicionada ao desempenho da taxa de desemprego.

Em outubro, o número de trabalhadores contratados nos EUA - 204 mil - ficou bem acima do esperado. Especialistas acreditam que, quando a geração mensal de empregos fica em torno de 180 mil a 190 mil, a tendência da taxa de desemprego é diminuir. Nos últimos três meses, a média mensal foi de 202 mil e, em 12 meses, de 194 mil.

Os dados fizeram o mercado acreditar que o Fed pode antecipar para dezembro o início da redução gradual ( tapering , em inglês) da compra mensal de ativos. A expectativa mexeu com os mercados, provocando nova rodada de valorização do dólar.

O responsável pela gestão de recursos de um grande banco americano disse esta semana, numa conversa com gestores brasileiros em São Paulo, que vê 25% de chances de o Fed começar o tapering em dezembro, 25% na reunião de janeiro e 35% em março. Isto significa que ele atribui 85% de chances de a medida ser tomada até o fim do primeiro trimestre de 2014, uma possibilidade que parecia remota até pouco tempo atrás.

O que pode aumentar as chances de uma decisão já em dezembro são os próximos números do mercado de trabalho. Se a contratação de mão de obra em novembro superar os 180 mil postos, a expectativa é que o Fed antecipe a inauguração do processo de normalização monetária.

O efeito desse processo sobre economias como a brasileira não é totalmente previsível, mas já se sabe que o real perderá valor frente ao dólar, como ocorre desde maio, quando o Fed começou a falar em tapering . Ao contrário de outros períodos de turbulência, em que o real sofreu forte desvalorização para depois devolver toda a depreciação, desta vez a moeda brasileira não deve voltar aos patamares anteriores. Uma das razões é que os termos de troca - a diferença entre os preços de exportação e de importação - que beneficiaram o país entre 2004 e 2010, graças ao boom da economia chinesa, já não são tão favoráveis.

Nas últimas duas semanas, a cotação do dólar saltou de R$ 2,23 para R$ 2,33, mesmo com o Banco Central (BC) mantendo o programa de intervenção diária no mercado de câmbio. Já há quem aposte na possibilidade de a moeda americana voltar a R$ 2,45, maior cotação registrada em 2013, antes do fim do ano.

Especialistas acreditam que o Fed concluirá o tapering em setembro de 2014. O passo seguinte é elevar os juros, medida que só deverá ser adotada, porém, no fim de 2015 ou em 2016. A normalização monetária dos EUA é algo, portanto, com que o mundo terá que conviver por pelo menos três anos.

O aumento do juro americano deve redirecionar os fluxos de capitais. A tendência é que os investidores passem a ter maior aversão a risco e, por essa razão, a privilegiar a aplicação em títulos da dívida americana. Sofrerá maior saída de recursos os países que não estiverem com os fundamentos em ordem.

O risco do Brasil é sofrer um rebaixamento de dívida soberana na largada do tapering . O rebaixamento já está nos preços dos ativos; o que não está é a perda do grau de investimento. Mas, se uma agência rebaixar o país e colocá-lo em perspectiva negativa, o mercado dará como certa essa perda, colocando-a no preço.

É visível a piora de percepção do Brasil. Depois de obter o grau de investimento em 2008, o Brasil passou a ser percebido como uma economia de menor risco que o México. Tome-se o comportamento do Credit Default Swap , um seguro contra calote de países e empresas. Em 2010, o CDS dos dois países passou a andar junto. Desde meados de 2012, há um descolamento em favor do México: na segunda-feira, a diferença estava em 95,17 pontos-base (ver gráfico).

A principal razão da piora da percepção do Brasil está na política fiscal. É importante que se diga que o país não está à beira da insolvência. O problema é que, além do forte crescimento da dívida bruta e do déficit nominal nos últimos três anos e da acentuada perda de credibilidade da gestão fiscal, o governo tem adotado medidas que contratam um desequilíbrio futuro.

Dois exemplos nessa seara são contundentes: a mudança retroativa do indexador das dívidas de Estados e municípios, de forma a permitir novo endividamento, e a medida que desobriga a União a cobrir o superávit primário dos entes federados quando estes frustram o cumprimento da meta.

O comportamento do CDS mostra claramente que o mercado está trazendo a valor presente a deterioração fiscal de médio prazo. Para agravar a situação, diante da política fiscal expansionista, o BC tem dado sinais de que irá longe com o aperto monetário, o que, por sua vez, elevará a despesa do Tesouro com juros da dívida, piorando o quadro das contas públicas.

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