FOLHA DE SP - 30/10
Dois dias separaram a amarga derrota da presidente Cristina Kirchner nas eleições legislativas de uma relevante vitória jurídica para seu governo: ontem, a Corte Suprema de Justiça da Argentina declarou constitucional a Lei de Mídia, promulgada em 2009.
No domingo, os partidos de oposição haviam sido escolhidos por quase 70% dos eleitores no pleito para renovação de metade da Câmara e de um terço do Senado.
Dessa forma, impediu-se que o conglomerado governista Frente para a Vitória alcançasse dois terços do Congresso, número necessário para aprovação de uma emenda constitucional que franquearia um terceiro mandato a Cristina.
O plano de perpetuação no poder parece sepultado, mas a agremiação da presidente ainda é a força política com maior apoio na Argentina (cerca de 32% do total) e preserva maioria no Legislativo.
Ademais, a derrota nas eleições legislativas de 2009 --com percentual similar ao deste ano-- não impediu que, em 2011, Cristina fosse reeleita à Presidência no primeiro turno, com 54% dos votos.
De resto, mantém-se a influência kirchnerista sobre o Judiciário, que deu razão ao governo no embate com o grupo Clarín, líder nos segmentos de jornais, TV e internet e principal alvo da Lei de Mídia.
Tal norma estabelece limite máximo de licenças de TV aberta e fechada e rádio detidas por grupos empresariais e impõe o teto de 35% de participação em cada mercado. Companhias que hoje desrespeitem esses ditames são obrigadas a devolver o percentual excedente.
Decerto é salutar que nações democráticas estimulem a competição privada e evitem monopólios no setor de comunicações, razão pela qual se justificam regras de controle de propriedade na mídia.
Na Argentina, porém, é evidente o caráter intimidatório da norma. A Lei de Mídia é apenas o componente institucional no cerco a veículos de comunicação críticos da atual ocupante da Casa Rosada.
Desde que o "Clarín" desembarcou do governo Kirchner, no primeiro mandato de Cristina, as autoridades deflagraram campanha de difamação à principal acionista do grupo, promoveram investigações fazendárias e invadiram a sede do conglomerado.
Com a lei, Cristina terá nova arma para tentar abafar a insatisfação crescente de diversos segmentos da sociedade. Sendo conhecidos os problemas econômicos da Argentina, como a inflação de 25% ao ano e a ameaça de desvalorização do peso, é fácil imaginar que serão turbulentos os dois anos finais da gestão Kirchner.
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