O GLOBO - 01/08
A inflação brasileira resiste em patamar acima de 5% ao ano, e uma das causas são os reajustes automáticos atrelados à alta de preços que passou
Desde que foi adotado o regime de metas, no segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, a inflação brasileira ficou abaixo de 5% em apenas três exercícios. Portanto, oscilou bem acima do centro da meta (4,5%) na maior parte do tempo.
O país ainda tem muitas dificuldades estruturais que precisa superar, mas, mesmo assim, a resistência da inflação não condiz com o ritmo de crescimento médio da economia nos últimos anos. Os piques da inflação, durante esse período, encontram explicações em choques de oferta ou demanda de determinados produtos. Mas essa resistência no patamar de 5% se deve a outros fatores, entre os quais se incluem os mecanismos remanescentes de indexação vinculados à inflação passada.
A indexação automática é sempre uma armadilha. Nos contratos de longo prazo, muitas vezes a indexação serve de proteção contra arbitrariedades dos poderes concedentes. No entanto, em algum momento essa questão terá de ser enfrentada, para que se consiga avançar mais rapidamente no combate à inflação.
E um dos pontos cruciais é sem dúvida a fórmula adotada para valorização do salário mínimo. Aumentos reais para o piso salarial eram uma reivindicação da sociedade, no esforço para se reduzir a desigualdade de renda no país. No entanto, a adoção de uma fórmula que se apoia no que aconteceu no passado, sem considerar as mudanças de conjuntura, foi uma armadilha, não só pelo fato de realimentar a inflação, como pela dificuldade política de alterá-la, mesmo que isso se faça necessário.
A fórmula vigora até 2015. Então, o momento de se desarmar mais essa armadilha está se aproximando. Pela fórmula, o reajuste do salário mínimo leva em conta a variação da alta de preços do ano anterior (medida pelo INPC), além do percentual de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes.
Quando a economia está em uma fase de progressiva aceleração, o impacto dessa fórmula diminui. Mas, na fase de declínio, comum nos ciclos econômicos, a fórmula vira uma bomba relógio.
Muitos economistas acham importante uma definição para o rumo do salário mínimo. Mas uma fórmula que engessa esse caminho acaba gerando graves distorções. A experiência mostra que, na fixação do mínimo, não se pode desconsiderar as mudanças de conjuntura, a evolução da produtividade do trabalho e as situações de pressão inflacionária.
Não é um tema fácil de se discutir politicamente dentro do governo ou no Congresso, mas, se as autoridades econômicas desejam avançar no combate à inflação, a fórmula de indexação automática do salário mínimo precisará ser revista. E a oportunidade é o fim do prazo para adoção da fórmula atual, ou seja, 2015. Logo no início do mandato do próximo presidente, quando ele tem capital político acumulado.
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