O GLOBO - 08/08
O Brasil, como todos os emergentes que aspiram a ser desenvolvidos, tem que crescer mais que os EUA — mas muito mais, pelo menos o dobro, e todos os anos
Uma boa maneira de aumentar as chances de vitória é escolher bem o adversário. Melhor pegar a seleção do Taiti do que a da Espanha, não é mesmo? O risco é sair de campo se achando o máximo por ter enfiado oito a zero em um time de amadores. Assim também nas comparações econômicas.
Os EUA, claro, não são o equivalente ao Taiti no campeonato mundial de PIB, mas estão crescendo pouco neste ano, algo como 1,8%. Vai daí, a presidente Dilma não resisitiu: “Eu acredito que vamos ter um crescimento bem mais robusto do que esse”, disse ela numa conversa com jornalistas em Varginha, Minas.
O que seria “bem mais robusto”? Como a presidente não especificou, é preciso procurar as estimativas disponíveis. Fora do governo, e depois de sucessivas revisões para baixo, o pessoal prevê 2,2%, conforme se lê no Relatório de Mercado, publicado pelo Banco Central toda segunda-feira com os cenários de instituições financeiras, consultorias e institutos de estudos.
Bom, 2,2% é melhor que 1,8%, mas só um pouco. De todo modo, como a presidente e seus assessores acham que o pessoal de fora está muito pessimista, convém procurar uma estimativa oficial. A do BC, por exemplo, certamente a instituição mais bem preparada para isso. Também depois de revisões para baixo, o BC prevê 2,7% de expansão do PIB para este ano. Aqui já temos quase um ponto percentual acima do desempenho americano, placar que, para PIB, é, digamos, robusto.
No ano passado, o PIB brasileiro chegou a US$ 2,4 trilhões. Coloque 1% em cima disso e verá como faz diferença. Mas aqui o campeonato começa a virar contra o Brasil. O PIB americano, o maior do mundo, alcançou US$ 15,6 trilhões — de maneira que o 1,8% de crescimento deles vai gerar muito mais riqueza que os 2,7% do Brasil, se o BC estiver correto.
Considerando ainda que os EUA, além de grandes, já são ricos, com um PIB per capita quatro vezes maior que o brasileiro, a conclusão é clara: a presidente Dilma escolheu o adversário errado. O Brasil, como todos os emergentes que aspiram a ser desenvolvidos, tem que crescer mais que os EUA — mas muito mais, pelo menos o dobro, e todos os anos.
Em resumo — o resultado 2,7% versus 1,8% infelizmente não nos leva à final. O campeonato que conta é o seguinte: quem, entre os emergentes, se aproxima mais rapidamente dos EUA em tamanho e riqueza? A Coreia do Sul, por exemplo, é uma medalhista de ouro. Nos anos 60, era mais pobre que o Brasil. Hoje, seu PIB per capita é o dobro do brasileiro e mais da metade do americano.
O Brasil está crescendo menos que a média dos emergentes e menos até do que a média da América Latina. E tem inflação mais alta.
Aliás, a presidente Dilma também comemorou ontem, justamente, a inflação de julho, que deu zero, pelo IPCA. Isso prova, concluiu, que a inflação está “completamente sob controle”, ao contrário do “estardalhaço de que tínhamos perdido”. Um IPCA de zero é certamente um excelente resultado, dispensando comparações. Mas também aqui parece que a presidente escolhe adversários errados.
Tirante políticos militantes de oposição, não há ninguém no Brasil dizendo que a inflação pode sair de controle — ou seja, chegar a níveis parecidos com os da Argentina, por exemplo, com aqueles desastres de controles e congelamentos de preços. No mesmo Relatório de Mercado, o pessoal de fora do governo prevê um IPCA de 5,75% para este ano e de 5,87% para 2014.
Está acima da meta (4,5%), mas não configura descontrole. Na verdade, o cenário de mercado está até alinhado com o BC, cujo compromisso para este ano é entregar uma inflação abaixo da verificada em 2012, que foi de 5,84%.
A questão, portanto, não é um campeonato de PIB com os EUA, nem de descontrole da inflação com os pessimistas locais. É a seguinte: o Brasil, de 2011 para cá, está crescendo na média de 2% ao ano, com inflação em torno de 6%. É esse também o cenário mais ou menos consensual para 2013, talvez com um pouco mais de expansão.
Isso está bom ou é pouco? Podemos fazer melhor que isso? E como?
Eis o tema central para as próximas eleições presidenciais.
Em tempo: nos meios internacionais, a interpretação que se faz do desempenho americano é bem positiva. Se dá como certo que os EUA estão numa recuperação consistente e ascendente, com o setor privado muito forte, inclusive gerando um novo negócio, que é o gás de xisto, muito mais barato e que está revolucionando o setor de combustíveis e de química. E a inflação está abaixo da meta deles, que é de 2%, e o setor privado já gerou 1,4 milhão de empregos neste ano.
Teria sido melhor escolher como adversário a Espanha, que vai mal no PIB e no emprego, e que tomou três da gente no Maracanã.
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