O Brasil tem um histórico de problemas causados à própria população quando governantes, por populismo eleitoral ou para frear a inflação, não autorizam reajustes de preços e tarifas
As tarifas de transporte coletivo, energia, água e saneamento estão entre os chamados “preços administrados”, aqueles que dependem de autorização governamental para serem fixados e reajustados. Nessa situação estão os bens e serviços fornecidos diretamente pelo governo por meio de empresas estatais (a exemplo da energia, da água e da gasolina) e os fornecidos por empresas privadas mediante concessão pública (a exemplo do transporte coletivo e da coleta de lixo).
Em todos esses casos, e uma série de outros, tanto o estabelecimento do preço inicial quanto o reajuste anual dependem de autorização da prefeitura, do governo estadual ou do governo federal. Em grande parte, tais bens e serviços são fornecidos à população por meio de monopólios estatais ou monopólios naturais operados pelo setor privado, razão por que seus preços não podem ser livres, pois não há competição capaz de impedir abusos. Portanto, nesses casos, preço é responsabilidade do poder público.
Entretanto, o preço ou a tarifa de determinado bem ou serviço fornecido por uma das formas referidas acima não resulta de uma decisão política aleatória, mas sim de cálculo econômico que leve em consideração os investimentos iniciais, os custos de operação, os investimentos de reposição e o lucro necessário para remunerar o capital e financiar o crescimento e a modernização da empresa ofertante.
Se a tarifa de transporte coletivo – ônibus ou metrô – for fixada de maneira correta no início da operação, a cada ano em que os combustíveis e os salários dos empregados da companhia forem reajustados, o equilíbrio econômico-financeiro da empresa somente será mantido se as tarifas forem reajustadas na medida necessária para cobrir os novos custos. O valor da tarifa não deriva apenas dos custos de operação e da remuneração dos investimentos, mas depende também da eficiência do sistema de circulação e de boa gestão operacional do serviço. Um sistema mal-estruturado e uma gestão perdulária devem ser combatidos sempre – para isso, é preciso que o poder público tenha competência para resolver os problemas de circulação (em geral de responsabilidade dos municípios e dos estados) e capacidade de controle e fiscalização das operadoras dos serviços.
O poder público deveria ainda adotar a transparência total em relação ao funcionamento dos serviços e à planilha de custos, a fim de que os usuários diretos e a população em geral pudessem acompanhar e entender as razões do valor das tarifas e de seus reajustes. Esse é um dos motivos que deixam a população revoltada, pois, em geral, as tarifas e seus reajustes são fixados pelo poder público em negociações com as operadoras dos serviços sem a participação dos usuários. Dado o baixo grau de confiança na ética dos políticos, a falta de transparência é um estopim para a descrença e o protesto.
Os vários reajustes feitos nas tarifas de transporte coletivo Brasil afora e depois revogados diante da pressão das ruas (em São Paulo, aumentos no pedágio também foram descartados) ou eram corretos e tecnicamente necessários, ou resultavam de conchavos entre governo e empresas para explorar os usuários. Se os reajustes eram corretos e se destinavam a absorver elevações salariais e aumentos de custos de operação, as revogações vão impor prejuízos às operadoras. Nesse caso, várias questões ficarão no ar. Quem pagará os prejuízos? Como ficarão as tarifas no futuro diante dos aumentos salariais nas novas datas-base? Que confiança um futuro investidor terá em governos que descumprem contratos?
O Brasil tem um histórico de problemas causados à própria população quando prefeitos, governadores e União, por populismo eleitoral ou para frear a inflação, não autorizam reajustes de preços e tarifas. O exemplo mais recente foi a recusa da presidente Dilma em concordar com o reajuste dos preços dos derivados de combustíveis, quando deveria fazê-lo. A agonia financeira que a Petrobras vive até hoje e a perda de valor da companhia são efeitos deletérios que levarão muitos anos para ser corrigidos.
As vozes mais responsáveis devem alertar os manifestantes e a população em geral que os protestos não podem ser usados para promover a destruição financeira das operadoras dos serviços, pois isso não é do interesse de ninguém. Dos governantes, deve ser exigida transparência das contas e das informações requeridas para a compreensão do problema e das medidas que se fizerem necessárias.
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