Ainda que a renda seja mal distribuída no Brasil e que seja desejável buscar diminuir a distância entre ricos e pobres, o ISGF apresenta vários problemas
Está de volta à pauta do Congresso Nacional a proposta de criar o Imposto sobre Grandes Fortunas (ISGF), previsto no artigo 153 da Constituição Federal desde 1988 e inserido no plano de governo do PT de 2011. Essa proposta já foi feita em várias ocasiões, com variados formatos, incluindo o projeto do então senador Fernando Henrique Cardoso, apresentado em 1989. Agora, o projeto retornou e promete um longo debate até sua aprovação ou rejeição.
Ainda que a renda seja mal distribuída no Brasil e que seja desejável buscar diminuir a distância entre ricos e pobres, o ISGF, tido como instrumento para redução da desigualdade, apresenta vários problemas. Para começar, trata-se de mais um imposto na cesta de quase 60 tributos vigentes no Brasil, o qual, se aprovado, virá a se somar a uma carga tributária efetivamente arrecadada de 38% do Produto Interno Bruto (PIB). Considerando a sonegação, a economia informal e a inadimplência, a carga tributária nominal brasileira passa dos 50%, uma das mais altas do mundo. Portanto, o que menos o Brasil precisa é de tributos novos.
Seria útil debater as razões da má distribuição da renda no país, assunto sobre o qual o Ipea, um instituto de pesquisa do governo, deu contribuição recente em um estudo mostrando que o Estado brasileiro, em todos os níveis, é causador de desigualdade de renda. As vias pelas quais o governo causa desigualdade são várias, como a remuneração de seus servidores, 23% acima da média do setor privado para as mesmas funções; as aposentadorias e pensões dos funcionários públicos; e os tributos indiretos – como o PIS, a Cofins, o ICMS –, que tomam dos pobres um porcentual da renda maior do que toma dos ricos.
Em países capitalistas, cabe aos cidadãos livres trabalhar, produzir, pagar impostos e acumular bens de capital – como fazendas, fábricas, lojas e empresas em geral – destinados à produção de bens e serviços e ao crescimento econômico. As fortunas – ou patrimônio – são formadas pela acumulação de rendas (salários, aluguéis, juros e lucros) não gastas em consumo, as quais são tributadas pelo Imposto de Renda e outros impostos estaduais e municipais. Os países desenvolvidos costumam tributar mais as rendas que o patrimônio, pois há os que ganham e gastam tudo, enquanto outros, mais prudentes e mais úteis ao sistema, poupam e acumulam.
O ISGF é mais um desestímulo à acumulação de patrimônio – especialmente se sua alíquota for elevada – e estimulador do consumo. Se a alíquota for pequena, o custo de fiscalização, arrecadação e controle será grande em comparação com os valores arrecadados, acabando por não justificar sua criação. Outro aspecto a considerar é o fato de o governo ser menos eficiente que o setor privado, e isso leva a transferência de mais dinheiro para o setor público a diminuir a eficiência geral da economia. No caso brasileiro, há duas agravantes. Parte da arrecadação adicional será perdida nos custos burocráticos da administração do novo tributo e outra parte sumirá nos meandros da corrupção estatal.
Seria útil também examinar por que razões países como Alemanha, Inglaterra, Bélgica, Itália, Holanda e Japão instituíram o imposto sobre grandes fortunas e depois o abandonaram. Há poucos meses, ficaram conhecidos os casos rumorosos de artistas e milionários franceses que buscaram cidadania em outros países porque não se dispunham a entregar para o governo mais de dois terços de suas rendas acima de determinado nível. Esses casos mostram que um país não deve instituir tributos sem considerar o padrão mundial, sob pena de ver evadir parte do patrimônio construído em seu próprio território.
O ISGF é um tributo que tem apelo popular ao ser “vendido” à população como uma forma de tirar dos ricos para dar os pobres. Foi esse mesmo argumento que levou os Estados Unidos a aprovarem a Emenda n.º 16, em 1909, autorizando o Congresso a “impor e arrecadar impostos sobre as rendas derivadas de qualquer fonte...”, a qual passou a ser copiada por outras nações e, hoje, tributa tanto os ricos quanto os pobres. O ISGF é uma espécie de “imposto da raiva”, destinado a punir os ricos por terem acumulado fortunas, quando acumular patrimônio é a melhor forma de uma nação enriquecer, coisa que foi entendida pelo líder chinês Deng Xiaoping quando, na reforma de 1978, disse a seu povo: “Enriqueçam!”.
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