ZERO HORA - 04/07
Médicos e estudantes de medicina de todo o país promoveram ontem uma manifestação pública contra a proposta do governo federal de facilitar a vinda de profissionais estrangeiros para prestar atendimento em localidades urbanas e rurais onde, segundo a versão oficial, os brasileiros se recusam a trabalhar. As entidades médicas, que coordenam o protesto, dizem que a estratégia governamental é desviar o foco do verdadeiro problema, que é a destinação de verbas insuficientes para o Sistema Único de Saúde. Sugerem como solução para o impasse um programa de interiorização, com a criação de carreira de Estado para médicos e demais profissionais de saúde, além da destinação de 10% da Receita da União para o SUS. A diferença de visões entre o governo, com o respaldo da Federação Nacional dos Prefeitos, e os sindicatos e associações dos profissionais de saúde indica acima de tudo a retomada de negociações que contemplem o principal, que é o atendimento da população desassistida.
Seria mesmo um absurdo a importação de um número tão expressivo de profissionais formados sob outras condições, pouco afeitos à realidade brasileira e até mesmo, em muitos casos, com previsíveis dificuldades de comunicação com os pacientes. O melhor que o governo federal poderia fazer, em vez de ameaçar a classe médica com uma alternativa inviável, seria aproveitar a oportunidade para uma profunda revisão do sistema de saúde. Tão grave quanto a ausência de profissionais em localidades de difícil acesso é a lotação das emergências dos hospitais nos grandes centros urbanos ou a demora de meses para a marcação de uma cirurgia.
A correção desses problemas não depende da vinda de profissionais formados em outros países. Depende, isto sim, de um choque de gestão no setor de saúde, que em breve poderá contar com recursos dos royalties do petróleo. O momento, portanto, é oportuno para uma revisão administrativa que atenda não apenas alguns pleitos ora apresentados pelas corporações médicas, mas principalmente o clamor das ruas. Ninguém pode ignorar que, ao exigir hospitais "padrão Fifa", os brasileiros travestidos de manifestantes pedem apenas atendimento digno e acessível para todas as camadas da população, incluindo-se aí, evidentemente, os patrícios que moram no interior profundo e nos bairros periféricos.
Se existem médicos suficientes no país, como garante o Conselho Federal de Medicina, cabe ao governo e às entidades classistas encontrar um caminho viável para distribuí-los adequadamente e para fiscalizar com rigor a prestação do serviço, tendo como prioridade absoluta a necessidade dos cidadãos.
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