O ESTADÃO - 18/06
As condições prospectivas da economia brasileira continuam a piorar, pelo menos na visão dos analistas de mercado. Os ajustes semanais nas projeções para os indicadores macroeconômicos, organizados e divulgados pelo Banco Central no boletim Focus, dão sustentação a essas percepções.
O que já estava difícil ficou ainda mais complicado com o agravante trazido pelas trepidações recentes no mercado de câmbio. Elas refletem, principalmente, os movimentos prévios das nuvens de gafanhoto financeiras globais ao previsto início da reversão da política de afrouxamento monetário, nos Estados Unidos.
No caso específico do Brasil, não só a liquidez e a profundidade do seu mercado cambial estão à frente de muitos dos emergentes, o que colabora para que picos e vales das cotações do dólar se acentuem. Além disso, a economia está sendo pega em momento de fragilidade interna, inclusive e especialmente, nas contas externas, o que reduz o interesse estrangeiro de inversão no mercado brasileiro e aumenta a coceira para cair fora.
Explica-se a ansiedade em torno da decisão sobre juros nos EUA, ao fim da reunião do Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), o correspondente ao nosso Copom, nesta quarta-feira, e mais do que tudo, do discurso do presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, previsto para logo em seguida. A expectativa é de que as palavras de Bernanke contenham chaves para a decifração dos enigmas da data do início, da velocidade e das formas de execução do processo de enxugamento da liquidez promovido nos últimos anos.
Não importa que o cenário do momento apresente ambiguidades – o ímpeto da recuperação econômica americana é o principal deles –, cenas de “overshootings” explícitos, como as altas recentes além do razoável nas curvas dos juros futuros nos EUA, são típicas dos mercados financeiros. Uma certa correção dos exageros, na abertura dos mercados externos nesta semana e às vésperas do esperado evento desta quarta-feira, só confirma a regra – incluindo a regra de que, nessas ocasiões, o mercado brasileiro tende a ser um dos mais voláteis.
Ainda que não seja tão difícil desenhar as grandes linhas do que ocorrerá quando a retirada de liquidez tiver início, impossível antecipar seus movimentos mais abrangentes e efetivos. Em qualquer circunstância, a manobra é arriscada e exigirá grande perícia, para que não se volte contra o feiticeiro que a produziu. Reverter a liquidez extraordinária significa mexer num gigantesco vespeiro.
Calcula-se que, nos últimos cinco anos, os bancos centrais injetaram US$ 12 trilhões nos mercados financeiros e promoveram 500 cortes de taxas de juros. Essa montanha de liquidez, contudo, mal passa de 5% do estoque total de ativos financeiros em busca da melhor remuneração nos mercados globais.
Levantamentos sistemáticos do McKinsey Global Institute (MGI), braço de pesquisa da consultoria global McKinsey, indicam que esse estoque vem crescendo agora em ritmo mais lento – média de 1,9% ao ano desde o início da crise – do que o registrado no explosivo período que vai de 2000 a 2007. Mas já superou, em 2012, o recorde de 2007, alcançando estratosféricos US$ 230 trilhões. Mesmo que hoje represente “apenas” quatro vezes toda a produção mundial de bens e serviços, em um ano, ante quatro vezes e meia, em 2007, é um volume assustador de recursos.
É óbvio que deslocamentos descoordenados, ainda que somente de parte dessa imensa massa de recursos, têm potencial mais do que suficiente para produzir fortíssimas instabilidades na economia global. Por isso, embora já se comece a falar em outubro como data do início da reversão dos “quantitative easings” (QEs), é mais provável que o Fed espere um pouco mais – possivelmente até algum ponto de 2014 – por uma confirmação menos superficial e difusa da qualidade da retomada nos EUA. E que opere essa delicada “operação desmanche” com extremo cuidado, em pequenas e bem medidas doses.
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