Valor Econômico - 18/06
A performance macroeconômica durante os dois primeiros anos da presidente Dilma tem sido decepcionante. O crescimento econômico foi medíocre, ficando abaixo de 1,5% ao ano na média 2011-2012. A inflação permanece elevada e ameaça acionar os velhos mecanismos de indexação, abandonados desde o Plano Real como por exemplo o "gatilho salarial". Por fim, a situação externa, tão confortável durante os dois mandatos do presidente Lula, já mostra sinais de visível deterioração com a elevação do déficit em conta corrente para mais de 3% do PIB, com viés de alta. Em suma, trata-se de um quadro de "estagflação" com sérios riscos de crise de balanço de pagamentos a médio prazo.
A equipe econômica tem insistido em culpar o cenário externo pela pífia performance macroeconômica. Não resta dúvida que o quadro recessivo nos países desenvolvidos contribuiu para a desaceleração do crescimento da economia brasileira ao derrubar em quase 20% as nossas exportações de manufaturados, o que explica, em parte, a situação de estagnação da produção industrial prevalecente na economia brasileira.
Mas também não podemos esquecer que esse mesmo cenário permitiu que o Banco Central iniciasse um ciclo de redução da taxa de juros em meados de 2011, levando a Selic ao seu mais baixo patamar nos últimos 20 anos. Esse enorme estímulo monetário deveria ter induzido um crescimento robusto da economia brasileira, se a razão fundamental da sua estagnação fosse a escassez de demanda agregada.
O problema da economia brasileira não está no lado da demanda, mas do lado da oferta. A razão de nossa estagflação encontra-se na brutal perda de competitividade sofrida pela indústria brasileira nos últimos seis anos em decorrência dos efeitos combinados da apreciação da taxa real de câmbio, do crescimento dos salários acima da produtividade do trabalho e das deficiências notórias e crescentes em nossa infraestrutura. A apreciação cambial em conjunto com o aumento dos salários tem levado a um aumento extremamente rápido do custo unitário do trabalho, fazendo com que, em poucos anos, a indústria brasileira se tornasse incapaz de concorrer, tanto nos mercados externos como no mercado interno, com a indústria de outros países, notadamente a China. As deficiências de infraestrutura completam o quadro, acrescentando externalidades negativas à produção industrial doméstica.
Esses problemas são resultado da inconsistência do modelo de desenvolvimento adotado pelo Brasil no final do governo Lula e aprofundado nos dois primeiros anos da presidente Dilma.
Esse modelo de desenvolvimento baseia-se na ideia do "desarollo hacia dentro". Trata-se de um modelo no qual as políticas de redistribuição de renda e de aumento real do salário mínimo, em conjunto com uma forte expansão do crédito bancário, deveriam estimular um vigoroso crescimento dos gastos de consumo, o que levaria os empresários a aumentar os gastos de investimento, permitindo assim um aumento simultâneo da capacidade produtiva e da produtividade do trabalho. Nesse caso, seria possível obter um elevado crescimento do PIB e dos salários reais, ao mesmo tempo em que a inflação seria mantida sob controle.
Esse modelo de desenvolvimento, no entanto, se mostrou inconsistente no caso brasileiro. O forte crescimento da demanda doméstica no período (2007-2012) levou o desemprego a níveis historicamente baixos, fazendo com que os salários reais crescessem acima da produtividade do trabalho, exacerbando a perda de competitividade decorrente da apreciação cambial acumulada desde 2005. Para reverter a perda de competitividade seria necessário uma forte desvalorização cambial, o que causaria uma forte elevação da taxa de inflação, a não ser que seu efeito fosse contrabalançado por uma política fiscal mais apertada. O problema é que desde 2008 a política fiscal brasileira tem sido expansionista - além de ter um viés em consumo e custeio, em vez de investimento- tornando impossível um ajuste não inflacionário da taxa real de câmbio.
Em suma, o modelo de desenvolvimento brasileiro não pode alcançar simultaneamente dois objetivos, a saber: inflação baixa e estável e câmbio competitivo. Faz-se necessário sacrificar um objetivo para (tentar) alcançar o outro. Aparentemente, o apelo eleitoral fez a presidente Dilma escolher o controle da inflação, sacrificando no altar do poder as perspectivas de crescimento da economia brasileira.
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