O Banco Central está mais pessimista. Foi isso que ficou claro no Relatório de Inflação do segundo trimestre, divulgado ontem. A previsão de inflação subiu, e a estimativa para o PIB diminuiu. Algumas premissas foram alteradas para pior. O centro da meta ficou para ser atingido, algum dia, no próximo governo. Os juros continuarão subindo.
A previsão de crescimento do PIB foi reduzida de 3,1% para 2,7%, enquanto a estimativa para a inflação subiu de 5,7% para 6%. Aí está o dilema: a inflação exige juros mais altos, o crescimento baixo pode ser uma barreira para a política monetária.
O BC vinha prometendo uma inflação menor do que a do ano passado, que havia ficado em 5,8%. Só que nos vários cenários do Banco Central, o IPCA não irá para o centro da meta, de 4,5%, nem mesmo no primeiro trimestre de 2015.
É por isso que vários analistas ontem mudaram suas projeções. Passaram a achar que os juros subirão mais e por mais tempo. Há economistas convencidos de que mesmo piorando suas estimativas o Banco Central ainda está sendo otimista.
Na quarta-feira, no Congresso, o ministro Guido Mantega falou em buscar o déficit nominal zero. Não se comprometeu com data, mas só de falar nisso é curioso. Esse déficit nominal zero, ou seja, o equilíbrio nas contas públicas totais, após o pagamento de juros, é aquela proposta feita pelo ministro da Fazenda da época, em 2005, Antonio Palocci. A então ministra Dilma Rousseff achou a proposta "rudimentar" e disse que era preciso "combinar com os russos".
Com juros subindo, fica mais difícil atingir essa meta, não porque o objetivo seja uma ideia rudimentar, mas porque a tendência é de aumento das despesas, principalmente no ano que vem, na busca da reeleição da presidente. A principal dúvida é saber se a autoridade monetária terá autonomia para elevar a taxa até onde for necessário, mesmo que vá a dois dígitos.
A subida dos juros também esbarra em outros problemas: nível de atividade ainda fraco, inadimplência elevada, endividamento recorde. A economia brasileira está numa encruzilhada. Se não combater a inflação, a atividade cai porque as famílias perdem renda e capacidade de consumo. Se subir os juros para reduzir os preços, pode enfraquecer mais a atividade e alimentar a inadimplência.
É por isso que muitos economistas têm defendido um forte ajuste nos gastos do governo. O Banco Central alega no Relatório que acredita no cumprimento da meta fiscal do ano, e o ministro da Fazenda garantiu que a cumprirá. O ceticismo fora do governo é enorme em relação a isso. Os números do superávit primário caíram no acumulado de janeiro a maio. A arrecadação está crescendo abaixo do esperado, o governo tem elevado gastos de custeio e cortado investimentos. As desonerações destinadas ao consumo continuam. As manifestações nas ruas, mesmo tendo boas demandas, vão representar mais gastos, seja de prefeituras, governos estaduais e federal.
As reduções das tarifas de transporte público já foram incorporadas nas projeções do BC. Isso fica claro na queda da estimativa para os preços administrados, de 2,7% para 1,8% entre o relatório de inflação de março e o divulgado ontem. Mas não foi incorporada a alta do câmbio. O BC achava que não haveria muito impacto da valorização do dólar na inflação, mas a realidade não está confirmando essa hipótese.
Os preços no atacado voltaram a dar dor de cabeça este mês. Depois de ficar estável em maio, o IGP-M saltou para 0,75% em junho. A desvalorização do real pesou nos preços dos alimentos, que saíram de -1,98% para 1,01% entre os dois meses. Isso anula em parte o efeito positivo da queda de preços de alimentos e das reduções das tarifas.
Sobre o cenário internacional, o Banco Central enxerga os EUA em recuperação, a China reduzindo o ritmo, e a Europa ainda enfrentando a recessão. Pesando tudo na balança, o BC mudou sua visão e já não enxerga mais um cenário externo "desinflacionário". Segundo o banco: "o cenário central contempla ritmo de atividade global mais intenso no horizonte relevante para a política monetária, que, em se confirmando, tende a se manifestar em pressões de preços nos mercados globais."
Na linguagem do Banco Central, "o balanço de riscos para o cenário prospectivo se apresenta desfavorável". Ou seja, está tudo um pouco pior diante do que havia imaginado antes.
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