FOLHA DE SP - 11/04
Magistrados substituem um debate organizado acerca de deficiências da Justiça Federal por bate-boca sobre expansão bilionária do sistema
O quadro geral da Justiça brasileira é conhecido: atulhada de ações e pródiga em medidas protelatórias, não consegue resolver processos com a agilidade e a eficiência que se esperam desse Poder.
Com esse diagnóstico decerto concordam o ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, e os representantes de entidades de juízes que se reuniram com ele na segunda-feira. Daí não decorre que todos estejam de acordo quanto ao remédio a ser administrado ao Judiciário.
Na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou emenda à Constituição para criar mais quatro Tribunais Regionais Federais (TRF) no país --hoje existem cinco. Para as principais associações de magistrados, a solução dos gargalos da Justiça, ao menos na esfera federal, passa por essa medida.
Barbosa discorda, como deixou agressivamente claro ao acusar as associações de atuarem de forma sorrateira na aprovação do projeto e dizer que tais entidades "não representam a nação".
Sem que se tenham tornado menos reprováveis com o tempo, a desmesura e o destempero do presidente do STF já não constituem novidade. Nem por isso, contudo, lhe tiram a razão nessa matéria.
Comparado com as segundas instâncias das Justiças estaduais e trabalhistas, esse nível da Federal é o mais sobrecarregado. O número de juízes federais (primeira instância) subiu quase 700%, desde 1988, mas a evolução do quadro de desembargadores (segunda) foi de 90%. A relação desembargador/juiz é de 1 para 15 na Justiça Federal e de 1 para 5 nos ramos estaduais e trabalhistas.
Some-se a isso a justa ponderação de que as cortes federais são de difícil acesso para quem tem menos dinheiro. A 1ª Região, por exemplo, com sede em Brasília, responde por todo o Norte, parte do Nordeste e do Centro-Oeste.
Salvo prova em contrário, nada disso torna os novos TRFs necessários. A Justiça Federal pode se aproximar dos jurisdicionados com câmaras regionais, mecanismo de descentralização previsto na Constituição, mas jamais instituído. A digitalização dos processos pode cumprir, em parte, o mesmo fim, com o benefício adicional de dar celeridade à Justiça.
No quesito lentidão, seria preciso diagnosticar por que cada região --e cada juiz-- resolve processos em ritmos diferentes e por que alguns Estados têm, proporcionalmente, mais casos novos.
Seria igualmente oportuno investigar por que o Congresso decidiu criar os TRFs se, de acordo com a Constituição, essa competência é privativa do Poder Judiciário.
Sem responder a essas perguntas, não faz sentido destinar bilhões de reais à estrutura permanente dos novos TRFs. Afinal, não está certo que sejam a cura para os males da Justiça Federal.
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