A inflação estourou o teto da meta em março mas isso não significa que tenha fugido ao controle. Já em abril a taxa deve voltar a ficar abaixo de 6,5%. Em junho, pode haver novo estouro, mas depois volta a recuar para fechar o ano acima da meta e abaixo do teto. Mas o país saiu da zona de conforto com a inflação. É preciso evitar ideias como a de elevar a meta para caber na realidade.
Quase a metade da alta do IPCA nos últimos 12 meses vem de alimentos e bebidas, mas é um erro considerar que, por isso, não há nada a fazer e que tudo é resultado de um choque agrícola. Parte da alta dos alimentos é pelo frete e pelos serviços.
A inflação em 12 meses está subindo sem parar desde junho do ano passado. A taxa foi de 4,92% para 6,59% nesse período. As projeções dos economistas apontam para o ano terminando em 5,7%. Mas pode ser maior porque a cada momento há uma novidade. Ontem, a MB Associados divulgou uma análise dizendo que feijão e leite estão com pressões que não tinham sido previstas.
O IBGE informou que dos 6,59% da inflação até março, 3,12 pontos vêm do grupo alimentos e bebidas. Quase a metade. Mas o economista Luis Otávio Leal, do Banco ABC Brasil, explica que os alimentos no atacado têm tido deflação desde janeiro, pelos IGPs, e continuam subindo no varejo. Os fretes estão com alta de 50%.
O grupo alimentos e bebidas subiu 13% em 12 meses. O tomate virou o espanto da hora. Em um ano: 122%. O grupo dos tubérculos, raízes e legumes, que também inclui itens como cebola, cenoura e pimentão, aumentou de preço em 89%. As hortaliças e verduras tiveram alta de 25%. Esses são produtos que foram atingidos por fatores climáticos locais. Chuva excessiva ou seca. E isso é sazonal, pode melhorar nos próximos meses.
Há também a alta das commodities agrícolas que atingem o mundo todo. Mesmo assim, olhando para outros países, a inflação brasileira destoa. O Chile tem inflação de 1%. A Colômbia, de 1,8%. O Peru, de 2,6%, e o México, de 3,6%. Os EUA estão com inflação de 2% e a zona do euro, de 1,7%. Se o problema fosse apenas um choque global de alimentos, a taxa estaria alta também nesses países.
Os itens que mais caíram de preço nos últimos 12 meses sofreram forte intervenção do governo: energia elétrica (-15,62%), automóvel usado (-8,16%), automóvel novo (-3,22%). Parte da queda da energia será neutralizada pelo uso intenso das termelétricas. Os prefeitos adiaram o aumento do ônibus, atendendo ao pedido do ministro da Fazenda, mas as tarifas serão reajustadas em junho. O preço da gasolina e do diesel ficou congelado por um período, causando enorme prejuízo ao caixa da Petrobras. Tudo isso mostra que a inflação não está restrita aos alimentos e seria muito mais alta se o governo não tivesse atuado intensamente para segurar alguns itens.
Sete das 11 capitais onde o IBGE coleta os dados estouraram o teto da meta. A inflação em Belém é assustadora: 9,19% em 12 meses. A inflação dos mais pobres está no terceiro mês acima do teto e chegou a 7,22%. Há várias notícias preocupantes nos dados divulgados ontem.
A taxa de inadimplência elevada e o endividamento das famílias tornaram o jogo mais difícil para o Banco Central. Ontem, foi dito aqui que o indicador de inadimplência da Serasa subiu mais de 10% em março. Na verdade, o índice é do SPC. De qualquer forma, ele mostra um aumento grande, e esfriar a economia significa aumentar o nível dos calotes.
O estouro da meta informado pelo IBGE será revertido, mas a inflação está exigindo do governo mais e mais cuidados. O ideal é evitar explicações simplistas que subestimem o risco. Não se brinca com inflação.
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