Acordo transatlântico entre EUA e União Europeia, cuja negociação tem apoio de Obama, é mais uma ameaça ao Brasil em processo de isolamento
Os discursos anuais do Estado da União proferidos pelos presidentes americanos perante sessão conjunta do Congresso funcionam como peça política de afirmação de doutrinas, programas e linha de governo. O feito no fim da noite de terça-feira por Barack Obama teve sua importância amplificada, por se tratar de um pronunciamento balizador do segundo mandato do presidente, quando o governante tenta deixar a sua marca na Casa Branca, sem se preocupar mais em disputar votos. Deseja encerrar a carreira política em cargos eletivos com um passaporte para a História.
Devido ao peso dos Estados Unidos, deve-se prestar atenção a tudo que emana do governo e Congresso americanos. No caso deste discurso, destaca-se o anúncio formal feito por Obama de apoio às negociações bilaterais com a União Europeia sobre um acordo comercial transatlântico. O Brasil tem interesse direto no assunto — ou deveria ter. E mesmo que os responsáveis pela política externa brasileira desdenhem este projeto, o país será afetado por ele, caso venha a ser fechado.
Em artigo no GLOBO de terça, o ex-embaixador Rubens Barbosa chamou a atenção para a fase de mudanças por que passa o comércio internacional, com a assinatura de vários acordos bilaterais, na esteira do fracasso da Rodada de Doha, de liberalização do comércio em escala planetária.
Deste processo de evolução o Brasil está alijado, por ter feito uma opção ideológica errada. Como a política externa foi capturada pela visão terceiro-mundista simpatizante do chavismo e bolivarianismo, o comércio exterior brasileiro vai sendo engessado nas limitações crescentes do Mercosul, paralisado pela crise política, econômica e institucional da Argentina, situação agravada na absorção do bloco pela Alba, associação dominada por Chávez e os irmãos Castro.
Enquanto o Mercosul e o Brasil estão paralisados, o comércio mundial tende a fluir cada vez mais por meio de acordos entre economias e blocos. Não faz muito tempo, Chile, Colômbia, Peru e México se uniram na Aliança do Pacífico, próxima dos Estados Unidos e Ásia. O México já é do Nafta, junto com os EUA e Canadá.
Há dias, países latino-americanos reuniram-se com a União Europeia, no Chile. Perda de tempo, devido à visão autárquica de argentinos, venezuelanos, equatorianos e bolivianos, aliados preferenciais de Brasília.
Não será fácil a negociação entre americanos e os 27 países da UE. Separa-os um contencioso semelhante ao que existe quando brasileiros e europeus tentam se entender: desentendimentos em torno de exportações agrícolas, o setor de serviços, proteção à propriedade intelectual, por exemplo. Mas se trata de um gigantesco fluxo comercial de US$ 2,7 bilhões diários. Se chegarem a algum entendimento — importante para os dois —, o Brasil, amarrado a um Mercosul de tonalidade chavista, ficará mais para trás neste novo comércio internacional.
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