FOLHA DE SP - 03/02
Com o "Esquenta!" Regina Casé parece ter encontrado o tom certo no momento exato
Nascido no rádio, o programa de auditório se tornou, com o tempo, um dos gêneros mais importantes da TV, talvez aquele que exponha de forma mais explícita as melhores e piores características desse meio.
Hoje, quase todos os programas de auditório são gravados, o que explica, talvez, uma provocação que Faustão adora fazer aos colegas do ramo: "Quem sabe faz ao vivo".
Há vantagens e desvantagens em ambos os formatos, mas a essência do programa de auditório -o "calor" oferecido pelo espectador presente no estúdio- não muda muito, seja ele ao vivo ou gravado.
O público no auditório oferece um atestado de "verdade" ao que o espectador vê pela televisão. Sabemos que esses espectadores são orientados por "animadores" a aplaudir, gritar ou vaiar, mas muitas vezes a mágica funciona e sentimos que também estamos ali.
Não à toa, o programa de auditório é o espaço preferencial da chamada publicidade "testemunhal", feita pelo próprio apresentador. Também é a vitrine ideal para os lançamentos pautados pela indústria musical.
O auditório serve bem, ainda, de cenário para promessas de dinheiro fácil -seja, como faz Silvio Santos, atirando dinheiro, seja em "games" no palco. Por fim, não há lugar melhor que esses programas para a exploração da miséria alheia, associada à promessa de assistência.
Com seu "Esquenta!", Regina Casé oferece uma alternativa a esse modelo. Não é nenhuma revolução, mas uma, digamos, reforma suave.
O programa é o aprimoramento de diversas outras experiências que Regina e sua equipe vêm fazendo desde o "Programa Legal" (1991-1992), e depois em "Muvuca" (1998-2000) e "Central da Periferia" (2006), com a pretensão de mostrar o "país real" ao espectador.
Várias destas iniciativas, escrevi em janeiro de 2011, foram marcadas por um tom missionário, incômodo, bem como por uma felicidade ingênua que não encontrava guarida na realidade do país. Com "Esquenta!" Regina parece ter encontrado o tom certo no momento exato.
O primeiro entrevistado na estreia, há dois anos, foi Lula, recém-saído da presidência. Na estreia da terceira temporada, em dezembro de 2012, a convidada de honra foi a presidente Dilma. Pouco à vontade diante de repórteres, ambos se sentiram em casa com Regina.
Há algo de politicamente correto na proposta de exibir, em um domingo atrás do outro, experiências de inclusão social, superação de dramas individuais e vitórias contra a desigualdade. Mas "Esquenta!" não faz assistencialismo nem procura vender ilusões.
Quente e colorido como não se via desde Chacrinha, o auditório de Regina exala uma espontaneidade que parece mais natural que a média. E, ainda que editado, vende uma alegria que não se vê na concorrência.
Do ponto de vista musical também há uma novidade na insistência com números de samba, pagode, funk e hip-hop. Não que sejam artistas fora do mercado, mas estão longe de representar a música fácil e óbvia que toca em todo lugar.
"Queria deixar claro que não queremos que alguém goste de funk ou pagode. O que a gente prega é a tolerância", disse Regina ao promover a estreia da terceira temporada. O próximo passo é o "Esquenta!" ser incorporado à grade fixa da Globo.
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