O GLOBO - 03/02
A concentração de terras em poucas mãos, herança do Brasil colonial, alimentou, e ainda alimenta, muita luta política — embora hoje, menos. O latifúndio é parte da história do país, seja como força política no Império e na República Velha ou peça de exploração ideológica principalmente na segunda metade do Século XX.
O termo “reforma agrária” se tornou cativo de programas de governo, sempre encontrado em discurso políticos. Mesmo sendo de uso corrente nas pregações de esquerda, constou dos planos da ditadura militar. Espaço político em que forças extremadas se aliaram a representantes da Igreja, a reforma agrária emergiu na redemocratização como uma das bandeiras mais fortes. E com as liberdades civis restauradas, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), entre outras organizações, puderem agir sem cerceamentos autoritários, como deve ser na democracia.
Considerados os quatro mandatos de FH e Lula e os dois anos de Dilma, são uma década em que os movimentos de sem-terra contam com algum trânsito em Brasília. Mais com os petistas do que com os tucanos. E continuam a reclamar por mais terras. A mudança estrutural em curso no mundo agrário, e que põe em xeque o MST e similares, tem a ver com o extraordinário desenvolvimento da agricultura brasileira a partir da década de 70, com a conquista dos cerrados, a criação da Embrapa, etc.
O “latifúndio improdutivo” foi extinto — quem diria? — pelo avanço do capitalismo no campo, na expansão da fronteira agrícola até as franjas da Amazônia, processo no qual o país realizou a antiga e batida profecia do “celeiro do mundo”.
O surgimento da grande empresa agroindustrial não seu deu em prejuízo do minifúndio e da agricultura familiar. Ao contrário. Um exemplo são os frigoríficos no Sul, dependentes de uma enorme rede de pequenos criadores, e vice-versa.
A modernização do campo, ao lado da inexorável tendência de urbanização da população, começou a reduzir a massa de manobra à disposição do MST. A ponto de a organização ter de recrutar “militantes” entre os desempregados em pequenas e médias cidades — sem vocação para a agricultura, é certo. O momento de pleno emprego na economia e a expansão dos programas sociais (Bolsa Família) puxaram de vez o tapete do MST. E nos assentamentos existentes, mostrou O GLOBO, a nova geração já busca ampliar a perspectiva de vida nas cidades — com razão.
O sonho de uma economia coletivizada eficiente não agoniza apenas em Cuba, também coloca a Venezuela na mesma rota desastrosa. No Brasil, devido ao dinamismo do mercado, esta proposta não teve chances, para sorte da democracia.
Há problemas a resolver, como assentamentos sem assistência técnica, canais de comercialização, treinamento, educação. Mas a ideia da reforma agrária, do ponto de vista histórico, acabou. Resta ao MST legalizar-se como partido e buscar no voto apoio ao seu projeto de país.
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