segunda-feira, fevereiro 11, 2013

A pós-TV - LULI RADFAHRER

FOLHA DE SP - 11/02


Na profusão de tecnologias, todos parecem esquecer que a TV já era social muito antes de essa palavra virar moda


A ideia de interagir com a televisão existe desde antes da web. Nos anos 80, o teletexto era uma TV que transmitia conteúdo adicional sempre que uma tecla específica do controle remoto era pressionada, usando o espaço em que hoje se transmitem legendas. Na década seguinte, redes de TV a cabo tentaram interagir com a telona de todas as formas, nem que fosse para pedir uma pizza durante um filme. Não pegou. Nos últimos anos, no entanto, a pós-TV parece ter se transformado no "Santo Graal" das tecnologias de consumo. Todos tentam fazer com ela o que a Apple fez com o smartphone.

Há quem defenda apps acionados por movimentos do corpo, embora celulares e tablets sejam mais práticos e individualizados. A turma do marketing tenta emplacar novamente o conteúdo "enriquecido", em que se pode saber mais sobre um comercial ao apertar um botão. Outros acreditam em t-commerce, comércio eletrônico via TV, por mais que a ideia de interromper um filme para comprar roupa pareça descabida.

A turma da versatilidade defende o Oled, LED orgânico. Sem luz de fundo, a tecnologia permite imagens de grande contraste em monitores translúcidos, mais finos do que uma folha de papel. Fundamental para telas dobráveis e de realidade aumentada nos próximos anos, o sistema é muito caro, tem vida útil menor e uma cor azul que não está bem resolvida, prejudicando o resultado final.

Outra tendência é a altíssima definição, o Ultra HD, com resoluções de 4 a 16 vezes maiores que as das HDTVs atuais. Fabricantes as definem como experiências próximas da do Imax, mas a implantação demanda tantas mudanças em infraestrutura que dificilmente elas serão viabilizadas em um futuro próximo. No cinema, a sensação é um 3D de maior realismo, exibido com mais do que os tradicionais 24 quadros por segundo.

Na profusão de tecnologias, comerciais, aplicativos e resoluções, todos parecem ter se esquecido do que se trata, afinal, uma televisão. Líder absoluta no entretenimento passivo, ela já era social, coletiva e conveniente muito antes de essas palavras serem levadas ao pé da letra. Na reunião de amigos para tomar cerveja vendo futebol ou no casal agarradinho comendo pipoca e vendo comédia romântica, a TV sempre foi uma arena de conveniência. Interagir com ela não é um benefício, mas um transtorno tolerado. Quem nunca se irritou ao perder o controle remoto que discorde.

Acredito que uma pós-TV deva dar acesso a Linha do Tempo, perfis e Busca Social do Facebook e de outras redes, contando novidades e fofocando indiscrições. Ligada ao Skype com uma webcam, ela pode reunir amigos e familiares à mesa de jantar. Seus controles podem ser ativados por movimentos do corpo, embora o comando de voz da Apple e do Google seja mais conveniente.

Depois de calibrada, ela pode reconhecer seus usuários e adaptar sua programação a eles, buscando no YouTube o que não encontrar no Netflix ou nas emissoras. Conectada a poderosas bases de dados, não tem dificuldade em sugerir conteúdo e coletar reações.

Essa experiência pode transformar a TV em um ambiente contextual, entregando voluntariamente tudo o que se procura nas redes sociais. Se isso acontecer, ela voltará a dominar a sala, revolucionando o entretenimento como o conhecemos.

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