O ESTADO DE S. PAULO - 26/01
Para Galbraith, as previsões dos economistas em geral serviam para reforçar a crença na astrologia. Apesar de alguma semelhança, consultorias financeiras sempre mobilizaram maior volume de recursos materiais e humanos para produzir previsões do que as colunas de astrologia. Não se pode desprezar, porém, o esforço de institutos de pesquisa que se dedicam mundo afora a fazer previsões de longo prazo sobre os Rimos da economia. No Brasil, não temos o hábito de pensar em prazos mais longos e pouco importam as perspectivas de uma década ou mais. O interesse se volta para o ano que se inicia. Mas, diante de um mundo cada vez mais integrado e sujeito a freqüentes turbulências, não nos podemos eximir de projetar- o futuro, principalmente na encruzilhada em que o Brasil se encontra.
Se formulações e objetivos são conflitantes com a realidade, os desejos de crescimento e superação da desigualdade se tomam menos alcançáveis. É praticamente impossível crescer a mais de 3% ou 4% com uma taxa de poupança em relação ao PIB de menos de 20%. É difícil superar os gargalos na infraestrutura com uma capacidade de investimento público inferior a 2% do PIB e com indecisões e mudanças nas regras do jogo pelo governo, que geram insegurança nos investidores privados. As infraestruturas são precárias e carentes de modernização e aumento de capacidade, comprometendo a competitividade das exportações e os custos para o mercado interno. Num contexto de crescimento baseado praticamente na exacerbação do endividamento e do consumo das famílias, não se tem uma idéia clara de como estimular o crescimento da poupança interna. Na formação de capital, ainda dependemos, em boa medida, da poupança externa.
Outra questão é a dependência da exportação de commodities, que teve importante papel na dinâmica do desenvolvimento recente, pois beneficiou o País com a geração de um excedente, resultado de preços favoráveis e aumento da demanda internacional. Mas para onde foi esse excedente gerado pela exploração dos recursos naturais? Aumentamos nossa capacidade de gerar conhecimento científico e desenvolvimento tecnológico? Geramos mais inovações e patentes? A maior especialização na exportação de commodities favoreceu em grande escala a modernização dos setores industrial e de serviços? E a inserção do País numa nova divisão internacional do trabalho, exportando matérias-primas e importando produtos industriais, é capaz dc sustentar um novo ciclo de desenvolvimento continuado? A exploração do solo e subsolo ocorre de forma ambientalmente sustentável ou haverá esgotamento, como em ciclos passados? As respostas a essas questões remetem à necessidade de estratégias mais consistentes de longo prazo.
Talvez o problema mais grave seja a qualificação dos recursos humanos. A precariedade e as carências se dão em todos os níveis, do ensino básico ao universitário, e exigem mudanças radicais, cujos resultados só aparecem no longo prazo. Sem isso, não se dará suporte ao crescimento da indústria e dos serviços modernos, ao desenvolvimento tecnológico e à criatividade. Importante, também, lembrar que, sem a contínua qualificação do fator trabalho, o País fica condenado a ter uma péssima distribuição da renda e a perpetuar a dependência dos pobres aos programas assistenciais.
É necessária a atenção para o manejo simultâneo das políticas de curto prazo, que lidam com a conjuntura, e as de longo prazo, voltadas para questões estruturais. A complexidade e a inserção internacional da economia brasileira não permitem mais que sc retomem discussões e modelos ultrapassados. As questões são muito mais complicadas e não se resumem a câmbio, juros e tarifas de serviços públicos. É verdade que a sociedade deseja crescimento e acesso a bens de consumo. Mas quer preservar a estabilidade da moeda e a melhor oferta de educação e saúde. Esses são os desafios de longo prazo. Como nas velhas receitas de bolos caseiros, se mexer muito em direções diferentes, desanda...
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