A manobra contábil usada pelo governo, para simular o cumprimento de metas das contas públicas, compromete a imagem que o Executivo vinha construindo na busca da austeridade.
O empenho com a gestão das contas federais, reconhecido pela própria oposição, acaba de ser ameaçado por uma manobra contábil da União. Para chegar perto do cumprimento da meta de superávit fiscal de 2012, o Planalto sucumbiu a uma tática que, se confirmada com os elementos divulgados até agora, nunca havia sido usada por nenhum governante. O que o Executivo fez foi um subterfúgio, sustentado por complexos mecanismos de trocas financeiras. O objetivo final, enfim alcançado, é resultado da apropriação de parte do Fundo Soberano do Brasil, o que permitiu ajustes na contabilidade federal, capazes de simular números próximos do compromisso assumido no início do ano.
O governo correu o risco de comprometer a própria reputação, usando indevidamente o dinheiro de uma espécie de poupança, criada para socorrer o país em momentos de turbulência econômica. O detalhe comprometedor é o que denuncia a forma como isso foi feito. O Planalto recorreu, em segredo, ao BNDES e à Caixa Federal para, fazendo operações cruzadas, em dezembro _ com o envolvimento até mesmo de ações da Petrobras _ ter acesso a pelo menos R$ 12 bilhões. Em síntese, socorreu-se quase secretamente de uma reserva especial, para tapar furos contábeis.
Infelizmente, o governo agiu na surdina. Fez tudo o que o setor público não deve fazer. O Executivo é obrigado a dar publicidade aos seus atos, sempre que estes envolvem recursos financeiros cuja aplicação precisa ser transparente, especialmente quando os protagonistas são um banco estatal e uma grande empresa com controle do governo. A prática adotada abre um precedente de alto risco, por dar a entender que o Planalto pode recorrer a outras formas pouco usuais de resolver seus problemas financeiros. Além disso, é preciso considerar que a atitude governamental subestimou a capacidade de fiscalização do Congresso, que já se manifestou, no sentido de exigir esclarecimentos dos ministros da Fazenda e do Planejamento.
É frágil o argumento, que certamente será utilizado, de que a manobra não compromete as instituições envolvidas, por ser apenas uma transferência de recursos de um caixa para outro. Não é bem assim. O governo mexeu num fundo com destinação específica, para produzir um resultado enganoso do esforço fiscal representado pela economia que procura fazer para pagar os juros da dívida. Desde o início do atual governo, foi exaltada a preocupação da presidente Dilma Rousseff em corrigir uma falha de seu antecessor, que descuidou da busca do equilíbrio entre receita e despesa. Durante os dois primeiros anos, até a descoberta da manobra agora divulgada, a chefe do Executivo marcou de fato sua gestão por ações concretas nesta direção. Ao se apoderar de recursos do Fundo, para assim poder maquiar suas contas, o governo compromete uma conduta e desrespeita os que levaram a sério a prioridade à austeridade.
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