quarta-feira, janeiro 16, 2013

Arma de repetição - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 16/01


O presidente Barack Obama é o que menos pediu elevação do teto da dívida entre os últimos presidentes americanos. O campeão recente foi exatamente o republicano considerado exemplo de austeridade: Ronald Reagan. Quando o Partido Republicano ameaça fechar o governo, como fez esta semana, é de novo resultado da polarização política do país e não defesa de princípios.

Segundo levantamento feito pela CNN, de 1962 para cá, o teto da dívida americana foi elevado 76 vezes, nos bons e nos maus tempos. Depois de Reagan, o pior número é de George Bush, pai, que em apenas um mandato pediu oito vezes a elevação do teto; Clinton, quatro vezes; Bush filho, sete vezes; e Obama, até agora, três.

Mas, para o país que é a primeira potência global, os Estados Unidos estão exagerando em sua licença para perturbar o mundo com essas crises apocalípticas sequenciais. Mal descansamos do risco do abismo fiscal e vem de novo o debate de elevação do teto da mamútica dívida de US$ 16,3 trilhões.

Na segunda-feira, o presidente Obama deu uma entrevista à imprensa ameaçando a oposição com o risco de o mercado entrar em pânico caso haja um novo confronto em torno do teto da dívida. "Os mercados podem ficar fora de controle. Os juros subirão para todos os que tomarem empréstimo. Isso pode ser uma ferida autoinfligida na nossa economia."

O teto da dívida já foi atingido no final do ano, e o Fed e a Secretaria do Tesouro têm usado "medidas extraordinárias" para esticar um pouco além esse limite. Mas a mágica acabará em meados de fevereiro. O debate está atrasado e é um ponto que neste momento está preocupando a economia internacional.

O secretário do Tesouro, Timothy Geithner, avisou que se o Congresso não elevar o teto pode faltar dinheiro para certas despesas e enumerou "benefícios sociais, aposentadorias de militares e veteranos, proteção contra desastres". O ex-presidente George Bush deixou uma herança pesada, que faz com que os Estados Unidos, desde então, segundo conta o "Financial Times", tenham que "tomar emprestado quarenta centavos em cada dólar gasto". A republicana Cathy McMorris Rodgers disse que, se for necessário, o governo tem que interromper suas atividades, fechar as portas, para entender que os republicanos estão falando sério sobre a necessidade de um plano de corte de despesas.

Claro que os republicanos têm razão em dizer que o presidente Obama precisa de um programa de curto, médio e longo prazos de corte de despesas, mas não têm razão quando se apresentam como defensores da austeridade fiscal tendo o passado que têm. Eles encomendaram, no governo Bush que aumentou muito as despesas militares nas duas guerras em que entrou, a bomba de efeito retardado que estourou no colo de Obama. O presidente, no entanto, até agora, às vésperas de iniciar o segundo mandato, ainda não tomou as rédeas nas mãos e não há um plano crível de redução paulatina dessa dependência do endividamento para pagamento de gastos de custeio.

O problema é que todo esse ruído gira em torno dos títulos que têm uma extraordinária credibilidade e que servem de parâmetro para a fixação dos preços de outros papéis. Se os investidores cobrarem mais para carregá-los, isso afetará a economia mundial. Os Estados Unidos continuam brincando de mocinho e bandido à beira do abismo. Se isso criasse apenas um custo autoimposto para a economia americana, não seria problema, mas pelo tamanho deles a queda de braço acaba afetando o mundo. E não acontece só ocasionalmente, passou a ser rotina. Depois de o mundo ter atravessado o réveillon preocupado com o abismo americano, agora neste primeiro trimestre há dois motivos para as forças políticas se digladiarem: o teto da dívida e um novo pacote de corte de gastos.

Em todos os dois casos, o impasse provocará efeitos econômicos no mundo inteiro, mas o problema será essencialmente político. Para a elevação do teto, os republicanos exigem cortes de despesas; na discussão do corte de despesas, os republicanos exigirão diminuição dos gastos sociais. Com isso, eles estão polarizando o quadro político americano para dificultar a administração de Barack Obama. Não que a oposição, em qualquer país, tenha que facilitar a vida do governo, mas no caso americano está havendo uma paralisia de decisões, com ameaças sucessivas de desastres que aumentam a instabilidade econômica global.

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