CORREIO BRAZILIENSE - 19/11
Não, não é o processo do mensalão e nem a ascensão de Joaquim Barbosa à presidência do Supremo Tribunal Federal esta semana que vão tirar o sono da turma do partido que ocupa o Palácio do Planalto. Tanto é que a presidente, ao se referir à Ação Penal 470 em entrevista ao jornal El País, ficou na declaração padrão, de que “acata” o resultado do julgamento. Tampouco o relatório da CPI do Cachoeira a ser apresentado esta semana pelo deputado Odair Cunha (PT-MG). Tudo isso é passageiro. Os problemas são de outras ordem. O principal deles, na visão dos estrategistas ligados à presidente, é manter a população segura de que Dilma Rousseff é uma excelente gestora, capaz de entregar o propalado desenvolvimento, deixando o país longe da crise econômica que abala o mundo e da qual nem a poderosa China escapa.
Na última semana, em Cádiz, Espanha, Dilma, mais uma vez, lembrou a todos os chefes de Estado presentes à Cúpula Ibero-americana as maravilhas da economia nacional e da criação do mercado interno brasileiro. Pontuou que desenvolvimento se faz com justiça social e investimentos, não com ajustes fiscais drásticos e cortes para todos os lados. Basicamente repetiu o que vem dizendo há dois anos, a respeito do que considera equivocado na forma de os europeus tratarem da crise. Foi enfática ao dizer que as medidas evitam a quebradeira financeira, mas não geram confiança nem Produto Interno Bruto.
Talvez a presidente esteja certa em sua análise externa, mas vale observar que, por aqui, o cenário não é essa calmaria toda. Quem tiver o cuidado de ler as seções de economia dos jornais brasileiros verá que as incertezas estão por toda parte. O Correio, por exemplo, mostrou ontem a nebulosidade do setor energético, no qual os problemas são de toda ordem. As encomendas da Petrobras feitas a empresas brasileiras para permitir a exploração do pré-sal estão atrasadas. A própria regulamentação do sistema de partilha, anunciado há mais de três anos, ainda não produziu seus efeitos. Os leilões de áreas de exploração estão travados. No quesito energia elétrica, tudo está em suspenso por enquanto, à espera da definição do novo modelo em discussão no Congresso Nacional. O tempo está passando e, com ele, as perspectivas de votar tudo ainda este ano vão se reduzindo.
Politicamente, há quem diga nos bastidores do PT que esse gargalo na infraestrutura é o maior iceberg que o partido precisa atravessar para chegar bem em 2014. E o maior problema é que ele se dá justamente no setor energético, de onde Lula pinçou a sua sucessora, apresentando-a como uma grande gestora. Se o setor de energia não destravar nos próximos dois anos, ficará fácil, na avaliação até mesmo de petistas, a oposição construir um discurso que ponha Dilma — e por tabela o PT — numa saia mais justa que o julgamento do mensalão.
Enquanto isso, na política…
Cresce o zum-zum-zum de que Dilma Rousseff convidará o ex-deputado Ciro Gomes, do PSB, para o Ministério de Ciência e Tecnologia, cargo que já foi ocupado por Eduardo Campos no governo Lula, logo que estourou o escândalo do mensalão. Assim, a Secretaria de Portos, onde está o ministro Leônidas Cristino, ficaria vaga para negociar com o PSD ou mesmo para ampliar o espaço do PMDB. O movimento teria ainda o objetivo de tirar fôlego de Leônidas, citado como uma possível opção para o governo do Ceará daqui a dois anos.
Assim, dizem alguns, Dilma estaria fazendo dois movimentos: primeiro, põe na vitrine o grupo do PSB que tem luz própria e anunciou que irá apoiá-la daqui a dois anos. Em segundo, atrapalha os socialistas na criação de um quadro que possa atrapalhar os planos do PT de conquistar o governo cearense daqui a dois anos. Afinal, enquanto a economia não der sinais de que não abaterá a nau petista, é preciso preparar o terreno da política com muito cuidado para não fortalecer potenciais adversários futuros. Esse trabalho requer tanta habilidade quanto contornar um iceberg.
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