FOLHA DE S. PAULO - 21/10
Serra mostrou-se, mais uma vez, nas palavras do jargão, grande puxador de votos -para o adversário
A provável vitória de Fernando Haddad, prenunciada na dianteira de 20% sobre José Serra nos votos válidos, tem vigor bastante para zerar as preocupações do PT com as possíveis e temidas repercussões, sobre o futuro petista, de condenações feitas pelo Supremo Tribunal Federal. As recentes e sigilosas reuniões de Lula com Dilma Rousseff e alguns petistas confirmam os temores e sua intensidade.
As preocupações justificavam-se já pela temeridade da escolha pessoal feita por Lula, impondo um candidato sem experiência eleitoral e pouco conhecido no eleitorado. Condições agravadas pela doença que minimizou a participação de Lula na campanha, pela agenda dada ao mensalão no STF e pela tradicional posição de grande parte dos meios de comunicação. Mas, na hora do enfrentamento, é inegável que muito desses agravantes foi compensado pelo adversário.
José Serra é o homem que não aprende. Mostrou-se, mais uma vez, nas palavras do jargão, grande puxador de votos -para o adversário. Com débito grande no eleitorado, pelo abandono da prefeitura e, ainda por cima, para o reprovado Gilberto Kassab, foi incapaz de reduzi-lo. Foi incapaz da criação de alguma ideia sedutora, de um argumento qualquer que remendasse sua imagem. Preferiu ser apenas o agressor descontrolado de sempre. Deu, porém, uma oportunidade ao eleitorado: a de dobrar-lhe a elevada rejeição e com isso desmentir que os eleitores esquecem tudo e depressa.
A propósito, o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, em alta hospitalar por diabetes e problemas renais, afirmou que "o mensalão não foi bandeira de campanha do PSDB". Fica a suspeita: ou trataram a crise errada ou deixaram efeitos colaterais esquisitos.
Agora quem fará reuniões de temor e preocupação é o PSDB. Necessárias a Aécio Neves, porque a provável derrota de Serra não o beneficia, como muitos têm dito e escrito. A vitória fortaleceria o partido como a derrota o descredencia, no eleitorado e entre as forças políticas. O jogo sucessório acelera-se a partir de agora. Com José Serra no partido que fez Kassab criar para uma eventualidade? É melhor não duvidar.
NA REALIDADE
Para não faltar com o mensalão. As ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia, seguidas pelo revisor Ricardo Lewandowski, recusaram a acusação de "quadrilha" no mensalão, entre outras razões porque, no Código Penal, configura-se como "crime contra a paz pública". Dois professores da Fundação Getulio Vargas/Rio propõem indagações a respeito, em artigo no "Globo": "Onde e como essa paz começaria a ser ameaçada? Pelo tamanho da quadrilha? Pela violência dos crimes?"
Às obscuridades muitos sugestivas para alguns ministros do STF, opõe-se a simples realidade leiga: a paz social é ameaçada quando o grupo tem a posse de armas, visa apropriar-se de bem alheio privado ou público, ou põe em risco a vida, a integridade física ou a propriedade de outrem.
E ainda há mais características exigidas para a definição de quadrilha. Se não para todos os doutores do Direito, por certo para as leis e a realidade. Mas tudo depende de querer julgamentos isentos.
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