REVISTA ÉPOCA
Com o início do julgamento do processo do mensalão, no Supremo Tribunal Federal (STF), muita gente voltou a falar em“pressão da mídia”.Muita gente mesmo. políticos, magistrados, jornalistas, advogados e cidadãos a granel apontam o dedo contra a tal “pressão da mídia”, quase sempre em tom de reprovação.A“mídia”, afirmam eles, estaria prejulgando os acusados e afrontandoosministros do stf comuma cobrança indevida e monstruosa. Já houve até quem comparasse essa “pressão” com uma “faca no pescoço”, como se os jornais, as revistas e as emissoras de rádio e televisão assumissemaforma de uma guilhotina colossal ameaçando nucas desprotegidas.
Por favor, se pode haver exageros e ataques pessoais inaceitáveis em algumas reportagens, há muitomais despropósito nesse discurso sobre a “pressão da mídia”. pense bem, você, leitor: o que eles querem dizer com isso? Estará em curso uma campanha dos meios de comunicação para condenar à execração pública todos os réus, sejam eles culpados ou inocentes?
Para responder a essas perguntas, comecemos comumesclarecimento de ordem semântica: “mídia” não é sinônimo de imprensa.oembaralhamento entre as noções de“mídia” e imprensa é traiçoeiro, perigoso. Estabelece umsinal de igual entre jornalismo, programas de auditório, novelas e publicidade, além de sugerir que tudo o que o jornalismo faz é propaganda ideológica. Nada mais falso.
“Mídia” é uma palavra esquisita. veio para nosso idioma pela transcrição da pronúncia inglesa do termo latino media, que é o plural de medium (meio). Media significa meios ou, em nosso caso, meios de comunicação: rádio, televisão, internet, veículos impressos e muito mais. dentro de cada um desses meios, os gêneros de programas são incontáveis. Há os humorísticos, as novelas, as missas, os cultos animados por telepregadores, aos borbotões bíblicos, além de transmissão de jogos de futebol. Há de tudoemais um pouco. Nada disso, porém, é jornalismo. Aliás, quando o jornalismo se deixa confundir com o entretenimento ou comapublicidade, ele se barateia, perde substância e deixa de informar com precisão.
Ora, quem se ocupa da cobertura do julgamento domensalão não é a“mídia”, mas os jornalistas, que trabalham para os mais diversos veículos, com as mais diversas orientações editoriais. quem vê nessa cobertura uma campanha da “mídia” acusa as empresas de “mídia” de articular uma conspiração “midiática”, dentro da qual os repórteres não passariam de serviçais dos interesses dos patrões, que são contra o governo. logo, imprensa é igual a propaganda e, em vez de informar, promove uma lavagem cerebral na nação, ela também inocente e desprotegida, como uma criança, como o pescoço em flor dos ministros do supremo.
Agora pense bem, você, leitor. você é criança? você não tem discernimento próprio? você é um cordeirinho nas mãos da máquina da“mídia”?Emais: será que você não tem direito de conhecer a fundo o processo do mensalão, que, por todos os motivos, já é um processo judicial histórico? Eu e você sabemos quemuitas vezes jornalistas se prestam a papéis indignos, mas não podemos qualificar de indigna a cobertura geral domensalão. Ao contrário: apesar de seus excessos, essa cobertura contribui para que conheçamos melhor os fatos e os argumentos de cada um. todos sabemos também que à imprensa não cabe julgar. o que ela deve fazer é contar o que se passa. se ela não cumprir esse dever, de forma crítica, independente e plural, a sociedade não terá como acompanhar a evolução do processo e não terá como fiscalizar e avaliar a decisão de cada um dos magistrados.
Não, não há “pressão da mídia”. Existe, sim, a exaltação de ânimos diferentes na opinião pública, e essa exaltação se reflete na imprensa. Existe a mobilização de setores da sociedade civil, para um lado e para outro, é bom lembrar, ora a favor dos réus, ora contra eles, em manifestações legítimas. quanto à imprensa, ela vem informando e debatendo, sob enfoques diferentes, dependendo de cada órgão jornalístico, numa diversidade que está aumentando no Brasil.
Quanto mais informação houver, mais chance teremos de que esse julgamento seja justo. A imprensa erra, é verdade, mas os erros que ela comete vão sendo contestados por outras vozes, numambiente plural, como deve ser,em que a opinião pública polemiza livremente. A liberdade de imprensa vai equilibrando a liberdade de imprensa. Naturalmente.
Os jornalistas, bem ou mal, estão cumprindo seu dever. que os ministros do supremo façamomesmo – e isso aqui não é pressão contra ninguém.os jornalistas estão cumprindo seu dever ao informar os fatos. Que os ministros do stf façamomesmo
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