domingo, agosto 05, 2012

Bienal do Livro: a conta não fecha - RAUL WASSERMANN


O público que vai encara aquilo como uma ida ao shopping. Os leitores mesmo se recusam a ir. Ao final, números maquiados na mídia e prejuízos silenciados

Nas conversas sobre passado e futuro das bienais do livro, lembro sempre da Fenit, feira de indústria textil que já foi chamada de "a São Paulo Fashion Week dos anos 1960".

Aos poucos, participar dela ficou tão caro para a maioria das confecções que surgiu a moda de alugar espaços em hotéis para apresentar as coleções nos mesmos dias da Fenit.

Recentemente, Danuza Leão comentou a SPFW na Folha. Descreveu as badalações e escreveu: "Sem dúvida, a SPFW é muito luxuosa. Mas será que essa conta se paga?"

Tirando o "muito luxuosa", a mesma pergunta poderia ser feita às bienais do LIVRO de São Paulo, do Rio e até de alguns outros Estados.

O tempo passou. Veio a informática, passamos dos estandes dos anos 1970, armados a tábuas e pregos, às tentativas de nos tornarmos a Frankfurt ou a Paris dos trópicos.

Só que esquecemos dos leitores, da finalidade primeira de uma feira do livro: desenvolver o mercado.

Mesmo tendo presidido duas edições da bienal de São Paulo e participado de sua organização por um bom tempo, sempre defendi uma versão mais light, para o desenvolvimento do mercado. Eu me preocupava com a sua transformação em feirão.

Hoje temos investimentos em estandes luxuosos, que operam lado a lado com bancas de saldos, recebendo um público que passa por lá no fim de semana como variação da ida ao shopping. Os leitores, principalmente de não ficção, ficam em casa, buscando na internet o que não encontram nas livrarias, recusando-se a frequentar aquele ambiente superpovoado.

O Salão de Ideias, só para citar um espaço da bienal que antes atraía um colosso de gente, há várias edições simplesmente não acontece.

A programação cultural, aliás, já começou mal para a edição de 2012. Segundo a coluna "Painel das Letras", da Folha, a organização não havia confirmado até as vésperas do evento quais autores internacionais deveriam participar neste ano.

As editoras, preocupadas, afirmaram que vão trazer autores de fora. A organização, que captou dinheiro da  lei Rouanet, disse que não tinha dinheiro para pagar as passagens, mas que incluiria os nomes sugeridos pelas editoras na programação.

Parceiras do mercado editorial, as livrarias não herdam nada, não há ação para levar o público a frequentá-las. O que existia foi enterrado.

Os números continuam sendo manipulados para sensibilizar a mídia. As declarações finais são sempre as mesmas, louvando a superação de todas as metas. Quem sai no prejuízo fica no silêncio, envergonhado.

Repito o que já disse há dois anos: por que não assumir que a fórmula está desgastada? Por que não criar um evento que só mostre a produção das editoras, com bons eventos culturais, proibição de descontos, iniciativas que levem público às livrarias e outros canais de venda e trazendo livreiros de todo o país?

Por que não retomar a tradição de dias reservados só para os profissionais? E por que não pensar em outro evento, com livreiros, que venda com descontos aqueles bons livros que toda editora tem, mas o público não encontra nas prateleiras?

Por que não fazer uma feira dirigida só ao público infantojuvenil? Vamos admitir: hoje adultos e crianças se atrapalham mutuamente.

Nada disso, entretanto, pode acontecer se não houver coragem e união da classe editorial. Insisto: é preciso sonhar com o desenvolvimento do mercado antes para colher em nossas empresas depois.

Enfim, a continuarmos na fórmula desgastada de sempre, só posso terminar com a pergunta de Danuza: será que essa conta se paga?


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