FOLHA DE SP - 18/05
Quem foi que apontou uma arma na fuça de Carlos Lacerda em pleno bar do Copa?
HOSPEDEI-ME NO Copacabana Palace na semana passada, o primeiro grande hotel que conheci, aos quatro anos de idade. De lá para cá, o Copa permanece sendo para mim um oásis onde tudo dá certo. Tão certo, que até o serviço de quarto consegue acertar o meu sexo, apesar de minha voz de Gengis Khan, atendendo aos meus chamados sempre com a mesma frase: "Pois, não senhora?"
Para quem já passou pela "benettonização" do mundo, vendo surgir uma loja padronizada em cada esquina do planeta, de Durban a Tiananmen Square, depois observou a mesma uniformização que ocorreu no vestir acontecer no mercado do luxo, na forma da "louisvuittonização", nada mais natural do que observar agora a estandardização da hotelaria. Não que o fenômeno seja novo, nada disso.
A essa experiência, em que o clássico foi desprezado em favor do pós-moderno ou do moderninho, eu chamo de "philippestrackização" e, pessoalmente, para mim, ela significa a morte.
Certa vez, hospedei-me em um hotel do arquiteto Philippe Starck em Nova York. Não consegui encontrar lugar para apoiar a mala, não dava para ler na cama, ajeitar o nécessaire no banheiro, enfim, era tudo tão minimalista que tive vontade de mandar o sr. Starck usar um daqueles espremedores de limão que ele produz para fins um tanto mais rústicos.
Mas voltemos ao Rio. Nesta semana mais um prédio desabou ao lado de onde estão a Petrobras e o hotel Glória, que está sendo renovando pelo novo salvador da pátria, Eike Batista. Vá você tentar dizer alguma coisa a seu respeito a um carioca em uma cultura acostumada a reverenciar qualquer barão que faça uma benfeitoria na cidade. Lembra do Aniz Abrãao, Castor de Andrade e do Nem? Pois então. Bastou fazer que ganha aplauso, ninguém nem sequer pergunta quem é.
E dá-lhe bandana na cabeça no Le Bristol de Paris e às favas com a tradição. Quem quer saber se Orson Welles ou Frank Lloyd Wright andaram pelo Rio ou se Santos Dumont e Ava Gardner curaram a ressaca no bar do Copa?
Em Santa Tereza, o hotel em que a Amy se hospedou sofreu arrastão? Não importa, é lá que o pessoal que frita a cabeça em Ibiza quer ficar.
O Rio de Janeiro é um visto de cima (esplendoroso) e outro (por vezes aterrorizante) visto da calçada. Os turistas que hoje atrai são todos duas estrelas. De três estrelas para cima, ninguém quer ir descansar em lugar com praias infectadas.
Endinheirado, mesmo, só vem para cá a turma dos bacanas, o pessoal in, que sabe circular e conhece aquele cara que conhece o outro, que vai na casa do Caetano e joga bola na casa do Chico. É a "wallpaperização" do sistema. Para eles existe o hotel Fasano, muito bacana, aliás, mas que atende a um circuito fechado.
Neste ano o naufrágio do Titanic comemora cem anos. Ele nos fascina até hoje por ter simbolizado, além de um tapa na presunção de domínio sobre a tecnologia, também o fim da era da "noblesse oblige". John Jacob Astor IV, o homem mais rico do mundo à época, recusou-se a subir nos botes salva-vidas para ceder seu lugar. Morreu de casaca ouvindo a orquestra e bebendo champanhe. Não estou dizendo que o Copacabana Palace represente esse tipo de espírito em contraste com a esbórnia da turma de lenço na cabeça.
Mas o Rio de hoje faz tudo para não merecer o Copa e seu valor histórico e cultural. Quem ainda se lembra quem foi que apontou uma arma na fuça de Carlos Lacerda em pleno bar do Copa?
4 comentários:
Ah, bom sao os turistas cinco estrelas de Nova York, Paris...
Que pessoa invejosa...dá até dó.
Errada ela não está em dizer que o Rio é assim. Está errada, sim, em não dizer que o Brasil todo é isso aí, não só o Rio.
Pena dessa Gancia e seu ranço colonialista. Pobre mulher. Não sabe o que diz. E como pode a Rolha publicar uma coisa dessa???
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