O ESTADÃO - 27/03/12
No dia 24/3, o editorial deste jornal explicou aos leitores que a baixa competitividade da indústria manufatureira do Brasil está ligada a deficiências históricas e que vão muito além do câmbio, incluindo aí o custo exorbitante da energia, dos impostos, do capital, da logística e da infraestrutura precária. No que tange ao fator trabalho, o editorial destacou o meteórico aumento dos salários.
Há mais de 30 anos venho escrevendo sobre o exagerado custo das despesas de contratação no Brasil, que chegam à elevada cifra de 102,43% sobre o salário. Por muito tempo falei sozinho ou, quando notado, era criticado por dirigentes sindicais, políticos e até colegas da academia que questionavam os conceitos básicos que embasavam aquele cálculo para dizer que as referidas despesas de contratação eram muito menores.
Há poucos dias encontrei um dos críticos, hoje ministro, que me pediu para ajudar a encontrar uma maneira de reduzir aquelas despesas. Vi que o seu apelo refletia o que hoje constitui uma preocupação central do governo federal, que, por estar aflito com a perda de competitividade da indústria de transformação, iniciou e pretende prosseguir no processo de desoneração da folha de salários.
O assunto é falado abertamente. As manchetes dos jornais estampam a preocupação coma perversa combinação de salários explosivos com produtividade cadente e, portanto, com a disparada do custo unitário do trabalho.
Os estudos neste campo são feitos usando os salários e os encargos sociais como a melhor "proxy" para estimar o custo do trabalho. Devo dizer que se trata de uma medida muito pobre, porque são inúmeros os componentes do custo do trabalho que não são captados por salário+encargos e que aumentaram de maneira espantosa nos últimos tempos. Dentre eles têm destaque o custo dos benefícios, como é o caso da participação nos lucros ou resultados (PLR); o auxílio-alimentação; o auxílio-creche; os convênios médicos; a previdência privada e vários outros benefícios que hoje são comuns no setor industrial. Além deles, há as despesas que decorrem das normas públicas, como é o caso das cotas para deficientes e aprendizes; das medidas de saúde e segurança; do custo do contencioso trabalhista e das indenizações, assim como o custo do bloqueio à terceirização; e o da grande burocracia que se faz necessária para destrinchar e administrar o enorme cipoal das exigências trabalhistas e previdenciárias. Não se podem esquecer ainda das despesas que de correm de licenças e afastamentos, assim como as atreladas aos treinamentos, adaptação e transferência dos empregados.
Há mais. Como no Brasil nem o passado é previsível, inúmeras são as decisões de governo que criam passivos inesperados, como ocorreu com a aprovação do aviso prévio proporcional e como adicional de 10% na indenização de dispensa. Tudo isso sem falar nas dispendiosas normas que estão sendo gestadas, como é o caso do ponto eletrônico,nalicençade180dias para a gestante e de 15 dias para o pai, a licença para fazer concurso público, o dia de folga para comemorar o aniversário e o "auxílio solidão", vejam só, auxilio solidão!
Agora que quase todo mundo concordou com os 102,43%, resolvi abandonar esse número. Ele serve apenas para denotar as despesas sobre os salá- rios. Mas nada diz sobre os gastos acima indicados que, se puderem ser matematizados, elevarão ainda mais o custo unitário do trabalho, piorando sobre maneira a doença da baixa competitividade da indústria de transformação.
Seria bom darmos uma parada para rever o que está ocorrendo no mercado de trabalho, no Congresso Nacional, nos Ministérios e nos tribunais de Justiça antes que cheguemos à situação da Europa, onde as reformas trabalhistas e previdenciárias estão sendo feitas a fórceps e com muita dor.
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