O GLOBO - 28/03/12
Depois do calote grego, Portugal e Irlanda são os candidatos a receber ajuda. Ambos já foram socorridos, estão fora do mercado, mas ainda carregam déficits públicos elevados. O governo irlandês fechou 2010 com um rombo de 30% do PIB. Reduziu para 10% em 2011, mas ainda ficará no vermelho em 8,5% este ano. Tem a seu favor o currículo de já ter feito um forte ajuste nos anos 90 e sua economia tem perspectivas de crescimento. Para Portugal, a situação é mais crítica porque, além do déficit alto, tem um buraco nas transações correntes e o país está há quatro trimestres em recessão.
- O desafio em ambos é muito grande: colocar as contas em ordem, de forma crível, e voltar a mercado no final de 2012. Portugal tem que fazer um ajuste maior, mas nos dois casos os programas são muito ambiciosos. O que vamos ver daqui a pouco é que o ajuste prometido é tão severo que os países não vão conseguir crescer. Por isso, houve esse anúncio do governo espanhol - explicou o economista-chefe do MSafra, Marcelo Fonseca.
Entre portugueses e irlandeses, há uma forte distinção: o mercado cobra 13,5% de juros para rolar a dívida do governo de Portugal e 5% da Irlanda. Os irlandeses têm a seu favor um passado de ajuste e se comprometeram a cortar gastos antes de receberem ajuda. Os portugueses passaram o período de bonança com déficits altos e usaram artifícios para melhorar as contas públicas recentes.
A chanceler alemã Angela Merkel admitiu esta semana que a Europa poderá manter em funcionamento os dois fundos de socorro, que juntos terão poder de fogo de cerca de 700 bilhões. Os líderes sabem que o calote ordenado grego não quer dizer que os problemas da Zona do Euro foram resolvidos. O governo português recebeu 78 bilhões em ajuda para ficar fora do mercado até o final do ano que vem. Mas isso significa que o país terá que voltar a ganhar confiança para ser financiado pelos bancos privados com juros mais baixos. O problema é que ninguém acredita ser possível reduzir essa taxa, dos atuais 13,5%, para padrões normais, em torno de 3%. Então só há duas saídas para Portugal, receber mais dinheiro ou dar um calote como fez a Grécia.
Outra diferença entre Portugal e Irlanda é o saldo em transações correntes, que mostra o fluxo de entrada e saída de moeda nos países. A Irlanda voltou a ter superávit em 2010, de 0,4%, e estima-se que tenha fechado 2011 no azul em 1,7%. Isso quer dizer que há mais euros entrando do que saindo do país, pelas mais diversas portas: balança comercial, remessa de lucros, captações de empresas e governo, gastos de turistas. Em 2011, por exemplo, as exportações irlandesas cresceram 3,4%. Já Portugal teve um rombo em conta corrente de 12% em 2008, que diminuiu para 9,8% em 2010, e ficará em 8,6% em 2011.
- O saldo em transações correntes reflete o grau de competitividade dos países. Tanto Irlanda quanto Portugal fazem parte da Zona do Euro e por isso não podem desvalorizar suas moedas para ganhar impulso via exportação. Se os irlandeses estão com superávit nas transações correntes é porque fizeram um ajuste muito forte, com corte de gastos do governo. Já os portugueses continuaram com o déficit no mesmo patamar - explicou a economista Monica de Bolle, da Galanto Consultoria.
Irlandeses e portugueses estão em recessão. Portugal acumula quatro trimestres seguidos de retração no PIB. Os irlandeses, dois, mas conseguiram terminar 2011 com alta de 0,7%, enquanto a economia portuguesa caiu 1,6%. O BC português estima queda de 3,3% este ano. O FMI prevê crescimento de 1,2% para a Irlanda.
Os dois também sofrem com o desemprego. A taxa chegou a 14,8% em janeiro, em ambos. O desemprego de jovens irlandeses, com menos de 25 anos, foi a 29,5%; entre os portugueses, subiu a 35,1%. Para se ter uma ideia, a média de desemprego de jovens na Zona do Euro é 21,6%. Na Alemanha, 7,8%. O número de casais portugueses em que ambos os cônjuges estão desempregados subiu 70% em fevereiro em relação ao mesmo mês de 2011.
Isso tudo está causando outro problema em Portugal, a emigração de jovens. O país está perdendo o talento de sua juventude, que tenta a vida em outros países diante da incapacidade de ingressar no mercado de trabalho. O número de emigrações chegou a 150 mil em 2011, admitiu o governo, para uma população de 10 milhões de pessoas. É o maior número de emigrantes desde o pico dos anos 60 e 70.
Uma boa notícia para a Europa, segundo Marcelo Fonseca e Monica de Bolle, foi o que houve com o CDS (credit default swap) grego. O CDS é um seguro que protege o comprador de dívida dos governos, em caso de calote. Havia um temor de que ele não fosse respeitado e o risco de que se fosse pago poderia quebrar as seguradoras. Eles foram respeitados e não houve quebra das instituições que venderam o seguro. Isso deu mais segurança ao mercado de dívida pública.
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