quinta-feira, fevereiro 23, 2012
Resenha - JANIO DE FREITAS
FOLHA DE SP - 23/02/12
Monstros, por aqui, têm pouco de artificial nas figuras que animaram a Europa, o Oriente Médio e parte da Ásia
O MUNDO não brincou menos do que os brasileiros que fizeram seu Carnaval nos últimos dias, e farão ainda nos próximos. As razões e os elementos dos Carnavais, já pelas naturezas diferentes de quem brincou cá ou lá, são muito diferentes, é claro. Os monstros de papel amassado e plástico, por aqui, têm pouco de artificial nas figuras que animaram a Europa, o Oriente Médio e pedaços da Ásia.
Nem o Vaticano conteve em suas indumentárias e ambientações também esfuziantes a excitação e, digamos, a índole da verdadeira diversão das potências e adjacências.
Estivemos muito ocupados com o nosso Carnaval. Nem por isso a animação nas partes decisórias do mundo merece ficar em um hiato histórico, povoado no conhecimento dos prezados leitores apenas pelos brincalhões de cá. É verdade que, à força de peculiaridades do nosso jornalismo, vários feitos dos brincalhões lá de fora, paralelos ao nosso Carnaval, são novidades aqui, mas não criações de agora.
É o caso do carnaval político na Alemanha, naturalmente mal-humorado, que vem desde os meses finais do ano passado. E enquanto a Vai Vai e a Ivete Sangalo cantavam por aqui, a Alemanha chamava por um terceiro presidente em apenas dois anos. O quase moço Christian Wulff, ao fim de três meses de escândalo, caiu ao peso da corrupção. A sua. O antecessor, Horst Koehler, caíra sob outra modalidade de corrupção, germanicamente mais natural. Trocou soldados alemães como se fossem peças, e então mandados para o Afeganistão, por negócios comerciais com os governos humanitários dos Estados Unidos e da Inglaterra.
Os dois decaídos foram indicações da chanceler Angela Merkel para o cargo que diziam ser apenas cerimonial, mas vê-se que tem outras utilidades. Assim podemos deduzir o motivo da ininterrupta dedicação de Merkel a pôr-se no primeiro plano em questões internacionais e nacionais alheias: o destaque externo é eficiente meio, entre políticos europeus, de confundir-se com a imagem do país e ver-se poupado, por isso, da queda em casa.
Alemães só ofereceram, porém, animação local. Netanyahu, Obama e o inglês Cameron ocupam a avenida com uma disputa empolgante.
Não há indicação alguma do que o primeiro e os extremistas israelenses estão respondendo, na prática, aos apelos dos outros dois para que Israel não faça (agora) o "ataque preventivo" que planeja contra o Irã.
O pouco material que transparece a respeito, na melhor imprensa internacional, é um velho indicativo de gravidade, e não de dificuldades atenuadas. Destas, há sempre um governante para colher os frutos, apodrecidos que sejam.
Gravidade que recebe, agora mesmo, uma contribuição significativa, de vários pontos de vista. Os investigadores da Agência Internacional de Energia Atômica, em sua segunda inspeção no Irã neste ano, relatam a impossibilidade de examinar todas as áreas que pretendiam. Seria lógico iniciarem por informar que o exame das usinas e instalações identificadas não encontrou sinais de finalidade militar. A relevância foi dada, porém, à recusa iraniana de abrir bases militares aos investigadores.
Tal exigência não foi feita em outros países, entre os quais o uranizado Brasil quando movia a ambição de tornar-se, com a ajuda de Israel e a companhia da África do Sul, a primeira potência nuclear do hemisfério Sul. E no Irã ganha outra estranheza: ciente do risco de ser atacado, o país desenvolve armas modernas, mas não nucleares, que ficariam desvendadas para os investigadores estrangeiros nas bases militares. Se há armas nucleares, a AIEA deve buscar outros meios de prová-lo.
O Irã não poderia ver o Carnaval de fúrias homicidas sem entrar na avenida. Tratou de cortar o seu petróleo para o Reino Unido e a França, fazendo o preço ocidental do barril subir de imediato, e inverteu o jogo. Ataque preventivo? Pois então, avisa, essa tática passa a ser do Irã. Os americanos já sabiam. Daí grande parte do esforço de dissuadir Israel de provocar, com ameaças intensificadas, o desatino iraniano.
Nem "L'Osservatore Romano" aguenta mais: o papa Bento 16 "é um pastor rodeado de lobos". As batinas carmim não deixam notar, mas a ferina luta no Vaticano pelo trono do papa é tão violenta, que a própria segurança vital de Bento 16 é motivo de preocupações e de precauções. E ninguém precisa especular sobre tais assuntos: são fatos e já estão em jornal. Muitos, inclusive no jornal mesmo do Vaticano. Entre palavras piedosas, sem falta.
Brincando com aço, átomo, gás, explosivos, morte, à sua maneira os americanos, europeus e médio-orientais não se divertiram menos do que os carnavalescos brasileiros. Mas, não sabem de nada, com as mulheres vestidas de cima até embaixo.
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