FOLHA DE SP - 12/02/12
Algo não está certo na economia mundial, ao menos nos países desenvolvidos há mais tempo. Os EUA parecem estar se saindo relativamente bem, por enquanto, mas mesmo em seu caso a produção continua bem inferior à tendência que prevalecia antes da recessão.
A Europa ficou mais para trás, o que diz algo de positivo sobre os pacotes de estímulo do governo americano, em contraste com o sadismo ortodoxo das políticas fiscais impostas pela Alemanha.
Keynes ofereceu uma visão da história mundial nos termos da qual existia uma tendência de que as tentativas de poupança se adiantassem à percepção de investimento.
Ele chegou a formular uma "lei psicológica" no sentido de que "mudanças no ritmo de consumo ocorrem em geral na mesma direção das mudanças no ritmo de crescimento da renda".
O resultado seria um potencial rombo na economia mundial, com desemprego desnecessariamente elevado. Diversos expedientes teriam ajudado a reparar esse rombo, entre os quais a construção de pirâmides e, posteriormente, catedrais.
Por algumas décadas depois da Segunda Guerra, o consumo pareceu subir em alinhamento com a renda, contradizendo Keynes, mas nos últimos anos isso mudou e a lei psicológica keynesiana parece ter ressurgido, o que cria brecha entre a produção potencial e a efetiva.
O que aconteceu? A resposta clichê está na ascensão da China, país no qual proporção espantosamente elevada de uma renda em rápida ascensão seria supostamente poupada -em montante superior ao que a economia seria capaz de absorver internamente. "China" é uma maneira de abreviar um grupo de países com índice alto de poupança.
A questão importante é determinar como o mundo vai lidar com o potencial de poupança excessiva.
A primeira resposta, ingênua, envolve o surgimento de oportunidades de investimento suficientes para absorvê-lo. Mas elas não podem ser criadas do nada.
A segunda abordagem é permitir que juro baixo lide com a pressão, ao tanto estimular o investimento quanto desencorajar a poupança.
A terceira abordagem envolveria suplementar os baixos juros com medidas mais diretas dos BCs, como o "relaxamento quantitativo".
A quarta é reconhecer que, se o setor privado gasta de menos, há oportunidade para estímulo fiscal: gasto público maior ou corte de impostos. É desnecessário dizer que essas perigosas armas podem ter efeito bumerangue, em longo prazo.
A quinta é ação internacional contra os países que poupem demais. Todos temos a esperança de que os cidadãos chineses venham um dia a insistir em desfrutar de proporção maior da prosperidade que seu país vem conquistando. Mas a ideia de que sanções internacionais possam levá-los a isso é absurda.
Uma sexta e perversa abordagem envolve protecionismo disfarçado. O surto de Obama contra a "terceirização" e a preocupação de Cameron com a venda de aviões militares à Índia representam exemplos disso. Expedientes como esses sempre resultam em perda para todos.
Uma sétima falsa resposta, estreitamente relacionada à sexta, depende daquilo que costuma ser designado como "aglomerado de falácias trabalhistas". Governos e empregadores podem tentar distribuir equitativamente o emprego disponível por meio de reduções compulsórias de jornadas de trabalho, antecipação de aposentadorias e outras ideias do tipo. O efeito líquido do processo seria reduzir o poder aquisitivo sem nada fazer para minorar o problema da estagnação elevada.
A oitava abordagem é atacar a "desigualdade". O argumento é que as classes pobres e médias gastem mais de sua renda. Na prática, se essa abordagem for promovida com vigor excessivo, pode desencorajar o investimento e o consumo.
A nona e pessimista resposta é que condições recessivas tendem a gerar um equilíbrio. Se elas persistirem por tempo suficiente, o potencial produtivo é contido, o treinamento e o investimento são desencorajados e os programas de austeridade parecem ter surtido efeito.
O que acontecerá? Uma mistura de todas as respostas acima, com mais intervenções perversas e menos estímulos financeiros do que veríamos em um mundo racional.
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