Resistência flower power
BARBARA GANCIA
FOLHA DE SP - 11/11/11
Turminha da USP fez uma resistência modelo retrô, igualzinha ao som que ouve e o carro imitando o antigo
Falo muito com os videorrepórteres do TV Folha quando saímos a campo. Deles todos, o Carlos é o que me empresta seus ouvidos com maior desprendimento, o garoto é um megafofo.
Outro dia chegou com o microfone de lapela danificado e eu lhe passei um belo sabão. Em vez de se fechar em copas, ele fez o contrário: foi abrindo um sorriso e alargando. Eu ainda continuava de cara feia dizendo que não ia dar para terminar o trabalho e ele olhando para mim como se eu fosse o Gay Talese. Dá para resistir?
Desde então tenho ensinado ao Carlos todos os macetes que conheço. A começar por uma regra básica: ande sempre com dois microfones de lapela.
Nesta semana o Carlos esteve em casa fazendo uma gravação. Quis saber o que achei sobre a invasão da USP. "Não sei se concordo com todos no Facebook, creio que os estudantes podiam ter pegado mais leve", disse-me.
Todos no Facebook acham que os estudantes agiram bem? Ué? Na minha página nem os mais liberais aprovaram a invasão. É claro, entre os amigos do Carlos e os meus deve haver uns 25 anos de diferença.
Pobre garotada da USP. De Robespierre às manifestações de abril passado na praça Tahrir, no Cairo, só existiu uma única modalidade de contestação no planeta. A dos oprimidos de um lado contra os opressores do outro. Todo mundo sabia muito bem quem eram uns e os outros, onde ficava o meio e quais os motivos que levavam Dany Le Rouge ou Lindbergh Farias à praça.
Em Zuccotti Park, o pessoal do Occupy Wall Street já nem ousa mais dizer que se está protestando. Apenas vão lá para propor uma discussão sobre não se sabe bem o que contra não se sabe bem quem.
Acreditamos vagamente que melou e que quem está por trás da detonação com efeito retardado do ecossistema, da democracia e do modelo capitalista é o mercado.
Turminha da USP é vítima duplamente e fez uma resistência modelo retrô, igualzinha ao som que ouve, o carro imitando o antigo e a moda que consome, tudo meio "romantic sixties". "Vamos tomar cacetada da polícia e fumar maconha no campus". "Flower power", bebê!
Pessoal não sabe se chama atenção colocando uma melancia na cabeça ou quebrando a reitoria. É uma geração encurralada por dogmas numa época em que ninguém mais convive com o que não é "bom", "certo" ou "bem-vindo".
Representatividade é conversa para boi dormir, certo?
Então a garotada protesta e não sabe porquê. A polícia reage na cacetada e não sabe porque não. Mas garanto que o governador está satisfeito com o resultado sabendo de tudo. Toda vez que os governos saem do centro das atenções, os governantes deliram de prazer. Não é para isso que desviam do assunto com aperitivos simpáticos como a faixa de ciclistas?
Pois a mim, a garotada da USP conquistou de vez quando expôs um grupo de múmias do Egito que se disseram simpatizantes da Primavera Árabe em nome de uma suposta limpeza na política tapuia.
Não percebem as senhoras do atraso que opinam no vídeo http://migre.me/67yyT que caso houvesse um movimento semelhante por aqui, ele seria liderado pelos invasores uspianos. Quanto a elas, bem, com muita sorte, estariam embarcando fugidas e embrulhadas no que restou de suas cortinas no primeiro cargueiro em direção ao Gabão.
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