Sombras sobre a China
GILLES LAPOUGE
O Estado de S.Paulo - 15/10/11
Os Estados Unidos sofrem, a Europa sufoca, a África tem fome, mas a China atravessa, impassível e triunfante, a crise econômica: essa é a "ideia recebida", a "verdade revelada" compartilhada por quase todos no planeta. E, em certo sentido, esse "dogma" da invulnerabilidade da China é tranquilizador. Enquanto o motor chinês continuar ligado, distribuirá sua energia aos outros continentes.
O problema é que, de uns meses para cá, esse "dogma" está fazendo água. Sinais inquietantes chegam da China. Em agosto e setembro, o superávit comercial chinês, tradicionalmente colossal, recuou. A razão é evidente: com a redução do consumo na Europa e nos EUA, a China viu seus mercados encolherem.
Podem-se ilustrar essas dificuldades comerciais pelo pânico que atinge as pequenas e médias empresas (PME) Na província de Zhejiang, 400 quilômetros ao sul de Xangai, que está repleta de pequenas empresas exportadoras, as falências aumentaram. Desde o início do ano, fecharam 72 mil pequenas empresas das 360 mil PME da região. Os jornais de Hong Kong se alarmam. A epidemia de falências assume as proporções de uma "histeria", dizem eles.
Segundo a internet chinesa, fato confirmado pela imprensa, 200 empresários da região desapareceram, no último ano, abandonando seus negócios. Essa hemorragia culminará no período do ano-novo. Trata-se de um hábito chinês: os empresários em dificuldade aproveitam o ano-novo para desaparecer sem pagar seus assalariados.
O mesmo fenômeno é assinalado em outras regiões. Ocorre que a economia chinesa repousa precisamente sobre as pequenas empresas. Segundo a agência Nova China, as PME criam 80% dos empregos do país. Em Pequim, planos de urgência são imaginados às pressas para aliviar os pequenos proprietários. Esses planos passam por uma reforma do sistema de crédito. A verdade é que os bancos preferem antes emprestar às grandes empresas que às pequenas. Uma consequência disso é que as PME cujos caixas estão vazios recorrem a "sociedades de garantia privadas" que praticam taxas de juros abusivas: no mínimo 20%. Em certos casos, até 100%. É a morte.
A desaceleração da China é observada também em outros países da Ásia. O Fundo Monetário Internacional (FMI) lançou um alerta. É fato que a região asiática resiste melhor que os EUA e, sobretudo, que uma Europa em debandada. Mas ela começa a sofrer. E sofre, precisamente, por causa da queda de atividade nos outros continentes. A China está doente. Seu mal se chama Estados Unidos e Europa. Pela primeira vez, o FMI salienta "a vulnerabilidade da Ásia e da China à deterioração da zona do euro".
Outro perigo se perfila: parte das monumentais reservas cambiais chinesas está no Ocidente. Esse é outro pesadelo de Pequim porque essas reservas poderiam se encontrar em perigo no futuro por artes da globalização. / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK
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