O plano Dilma
CRISTIANO ROMERO
VALOR ECONÔMICO - 31/08/11
O aumento do superávit primário em 2011 foi apenas o primeiro lance da estratégia do governo para o fortalecimento das contas públicas nos próximos anos. A presidente Dilma Rousseff vai se empenhar, agora, na criação de mecanismos para controlar a evolução dos gastos com o custeio da máquina pública.
Paralelamente, adotará medidas para preparar o mercado e o próprio governo para a aguardada queda da taxa de juros nos próximos meses e anos.
As prioridades do governo agora passam pelo Congresso. São elas: aprovar a criação do fundo de pensão dos funcionários públicos; criar um limite para a evolução das despesas de custeio; passar o projeto de lei que limita a expansão anual do gasto com salários do funcionalismo.
Se aprovadas, as medidas terão impacto fiscal relativamente modesto no curto prazo, mas ajudarão a conter a expansão da despesa corrente ao longo do tempo. Além disso, darão previsibilidade ao desempenho das contas públicas.
Em outra frente, o governo vai trabalhar em duas medidas delicadas, mas fundamentais para a convivência do país com um regime de juros baixos. Uma delas é a mudança do mecanismo de remuneração da caderneta de poupança, que, hoje, é TR mais 6% ao ano. Do jeito que está, a regra cria um piso para a redução dos juros no Brasil. A ideia é atrelar a sua correção a um percentual da taxa básica de juros (Selic).
Um outro tema sobre o qual o Ministério da Fazenda vem trabalhando é a desindexação da dívida pública. O plano é diminuir o uso de Letras Financeiras do Tesouro (LFT) como indexador da dívida. Emitidas pelo Tesouro, as LFTs são títulos de renda fixa, cujo rendimento é pós-fixado e dado pela variação da taxa Selic.
Toda vez que o Banco Central (BC) aumenta a Selic, a despesa do Tesouro com juros cresce imediatamente. Em 2002, quando o país enfrentou severa crise de confiança, as LFTs representavam 60,8% do estoque da dívida pública. Nos anos seguintes, com a estabilização, a participação caiu, sucessivamente, até chegar a 32,6% do total em julho deste ano. A ideia é reduzi-la ainda mais.
O plano, segundo fonte graduada, é chegar a 2014 com apenas 5% ou 6% de estoque de LFT. Trata-se de uma meta excessivamente ambiciosa. Uma das razões é que o estoque de operações compromissadas é de R$ 424 bilhões e está todo atrelado à Selic. O BC faz essas operações - venda de LFTs com compromisso de recompra - para enxugar liquidez no mercado. Grande parte do montante atual de compromissadas decorre da compra de reservas cambiais, seguro que o Brasil usa para enfrentar crises.
Eliminar simplesmente as LFTs seria abrir mão, em tese, do mecanismo que hoje dá conforto ao país em períodos de turbulência. Ainda assim, é possível, desde que a situação fiscal seja reforçada, reduzir o estoque de LFTs, se não para o nível mencionado, pelo menos a um patamar bem inferior ao atual.
"Vamos adotar estímulos à desindexação de curto prazo em títulos públicos e privados", contou um técnico. "Toda vez que o BC aumenta os juros, a potência da política monetária é menor que a de outros países, por causa da indexação dessa estrutura de papéis à Selic."
A travessia do Plano Dilma não é simples. Se fizer o que pretende, desagradará categorias fortes dos funcionários públicos, que já planejam greves em Brasília antes de conhecer as medidas. Depois, à própria base parlamentar de apoio ao governo, uma vez que é quase impossível conciliar austeridade fiscal com interesses fisiológicos e clientelísticos, típicos da coalizão que hoje apoia a presidente. Há ainda a caderneta de poupança, cuja mudança tende a ser explorada de forma populista pela oposição.
A presidente julga não agir no vácuo. Ela quer aproveitar o ganho de popularidade que vem obtendo junto à sociedade, graças à postura adotada em relação a malfeitorias cometidas por aliados no governo, para adotar neste momento as ações mais duras de seu mandato. Há, também, a justificativa da crise financeira mundial que se avizinha. Nas conversas que vem tendo, ela menciona o fato de que os países europeus que abriram a guarda na área fiscal estão agora sofrendo os piores efeitos da turbulência.
A presidente calcula que, como o país entrará agora em período pré-eleitoral, ela terá 18 meses para tocar uma agenda fiscal mais apertada. Seu objetivo é criar condições para o Comitê de Política Monetária (Copom) reduzir a taxa de juros. Estima-se que, se o governo der a musculatura fiscal necessária, o Copom poderá reduzir a taxa Selic real para 3% até 2014 -- hoje, está em torno de 6,18%. Com isso, o Tesouro Nacional diminuiria a despesa anual com juros em cerca de R$ 90 bilhões.
Ironicamente, em 2005, quando os então ministros Antônio Palocci (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento) propuseram ao presidente Lula um plano para zerar o déficit público em alguns anos, Dilma, então ministra da Casa Civil, torpedeou a proposta, classificando-a de "rudimentar".
"A presidente Dilma incorporou a ideia de que um fiscal forte é a base do sucesso", assegura um interlocutor frequente. "[Se ela fizer o que está prometendo], nos próximos 10, 15 anos, o Estado abrirá espaço para o desenvolvimento do país."
Paralelamente, adotará medidas para preparar o mercado e o próprio governo para a aguardada queda da taxa de juros nos próximos meses e anos.
As prioridades do governo agora passam pelo Congresso. São elas: aprovar a criação do fundo de pensão dos funcionários públicos; criar um limite para a evolução das despesas de custeio; passar o projeto de lei que limita a expansão anual do gasto com salários do funcionalismo.
Se aprovadas, as medidas terão impacto fiscal relativamente modesto no curto prazo, mas ajudarão a conter a expansão da despesa corrente ao longo do tempo. Além disso, darão previsibilidade ao desempenho das contas públicas.
Em outra frente, o governo vai trabalhar em duas medidas delicadas, mas fundamentais para a convivência do país com um regime de juros baixos. Uma delas é a mudança do mecanismo de remuneração da caderneta de poupança, que, hoje, é TR mais 6% ao ano. Do jeito que está, a regra cria um piso para a redução dos juros no Brasil. A ideia é atrelar a sua correção a um percentual da taxa básica de juros (Selic).
Um outro tema sobre o qual o Ministério da Fazenda vem trabalhando é a desindexação da dívida pública. O plano é diminuir o uso de Letras Financeiras do Tesouro (LFT) como indexador da dívida. Emitidas pelo Tesouro, as LFTs são títulos de renda fixa, cujo rendimento é pós-fixado e dado pela variação da taxa Selic.
Toda vez que o Banco Central (BC) aumenta a Selic, a despesa do Tesouro com juros cresce imediatamente. Em 2002, quando o país enfrentou severa crise de confiança, as LFTs representavam 60,8% do estoque da dívida pública. Nos anos seguintes, com a estabilização, a participação caiu, sucessivamente, até chegar a 32,6% do total em julho deste ano. A ideia é reduzi-la ainda mais.
O plano, segundo fonte graduada, é chegar a 2014 com apenas 5% ou 6% de estoque de LFT. Trata-se de uma meta excessivamente ambiciosa. Uma das razões é que o estoque de operações compromissadas é de R$ 424 bilhões e está todo atrelado à Selic. O BC faz essas operações - venda de LFTs com compromisso de recompra - para enxugar liquidez no mercado. Grande parte do montante atual de compromissadas decorre da compra de reservas cambiais, seguro que o Brasil usa para enfrentar crises.
Eliminar simplesmente as LFTs seria abrir mão, em tese, do mecanismo que hoje dá conforto ao país em períodos de turbulência. Ainda assim, é possível, desde que a situação fiscal seja reforçada, reduzir o estoque de LFTs, se não para o nível mencionado, pelo menos a um patamar bem inferior ao atual.
"Vamos adotar estímulos à desindexação de curto prazo em títulos públicos e privados", contou um técnico. "Toda vez que o BC aumenta os juros, a potência da política monetária é menor que a de outros países, por causa da indexação dessa estrutura de papéis à Selic."
A travessia do Plano Dilma não é simples. Se fizer o que pretende, desagradará categorias fortes dos funcionários públicos, que já planejam greves em Brasília antes de conhecer as medidas. Depois, à própria base parlamentar de apoio ao governo, uma vez que é quase impossível conciliar austeridade fiscal com interesses fisiológicos e clientelísticos, típicos da coalizão que hoje apoia a presidente. Há ainda a caderneta de poupança, cuja mudança tende a ser explorada de forma populista pela oposição.
A presidente julga não agir no vácuo. Ela quer aproveitar o ganho de popularidade que vem obtendo junto à sociedade, graças à postura adotada em relação a malfeitorias cometidas por aliados no governo, para adotar neste momento as ações mais duras de seu mandato. Há, também, a justificativa da crise financeira mundial que se avizinha. Nas conversas que vem tendo, ela menciona o fato de que os países europeus que abriram a guarda na área fiscal estão agora sofrendo os piores efeitos da turbulência.
A presidente calcula que, como o país entrará agora em período pré-eleitoral, ela terá 18 meses para tocar uma agenda fiscal mais apertada. Seu objetivo é criar condições para o Comitê de Política Monetária (Copom) reduzir a taxa de juros. Estima-se que, se o governo der a musculatura fiscal necessária, o Copom poderá reduzir a taxa Selic real para 3% até 2014 -- hoje, está em torno de 6,18%. Com isso, o Tesouro Nacional diminuiria a despesa anual com juros em cerca de R$ 90 bilhões.
Ironicamente, em 2005, quando os então ministros Antônio Palocci (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento) propuseram ao presidente Lula um plano para zerar o déficit público em alguns anos, Dilma, então ministra da Casa Civil, torpedeou a proposta, classificando-a de "rudimentar".
"A presidente Dilma incorporou a ideia de que um fiscal forte é a base do sucesso", assegura um interlocutor frequente. "[Se ela fizer o que está prometendo], nos próximos 10, 15 anos, o Estado abrirá espaço para o desenvolvimento do país."
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