Solução distante
CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 20/08/11
O mercado financeiro não viu razões para apostar no sucesso da proposta de criação de um "governo econômico" para a área do euro. Essa foi a principal conclusão a que chegaram os dois mais importantes chefes de Estado do euro, a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente da França, Nicolas Sarkozy, no seu encontro de cúpula de terça-feira passada.
À primeira vista, um mínimo de unidade política é o que mais se espera como precondição do fortalecimento do euro e, por consequência, de superação das graves crises que atacam o bloco. E, afinal, foi por esse caminho que a dupla enveredou.
No entanto, o mercado não viu firmeza na proposta, por um punhado de razões. A primeira delas: não ficou claro o que seria esse governo econômico do bloco. As declarações da dupla Merkel e Sarkozy sugerem que o Conselho Europeu, constituído pelos ministros de Finanças dos 17 membros do bloco do euro, representantes dos outros dez países que também compõem a União Europeia e, ainda, o presidente do Banco Central Europeu, se reúna duas vezes por ano para coordenar a política econômica da área.
Não ficou claro o alcance da proposta: se o objetivo é subordinar todas as políticas econômicas nacionais a um governo central europeu; ou evitar que cada país-membro infrinja o pacto de equilíbrio orçamentário (estabilidade fiscal).
No primeiro caso, seria necessário um amplo e profundo projeto de Constituição Europeia. Mas essa proposta já fracassou há alguns anos, quando um projeto de Constituição Europeia, mesmo que vago e pouco abrangente, foi rejeitado em alguns plebiscitos nacionais e, por isso, abandonado. Ou seja, se é para ir mais longe, como garantir sua aprovação pelo eleitorado que não quer abrir mão das soberanias nacionais?
E se é para somente fiscalizar o desempenho das contas públicas dos integrantes do bloco do euro, fica difícil acreditar que apenas reuniões semestrais garantiriam a observância de rígidas regras fiscais, até agora, amplamente desobedecidas. Em outras palavras, até o momento não se vê como conseguir impor os interesses comuns do bloco sobre os nacionais (enforcement, na expressão inglesa).
O problema de fundo é a necessidade de unificar enormes desigualdades entre os países-membros da área que, em vez e encolher, se aprofundam.
Neste momento, por exemplo, Grécia, Portugal e Irlanda amargam forte retração econômica. O grupo intermediário (França, Espanha e Itália) enfrenta crescimento próximo de zero. E há os em melhor situação (Alemanha, Holanda e Áustria), que devem crescer mais de 2% ao ano.
A periferia paga por sua dívida juros de 4% a 8% ao ano. Os países do núcleo pagam entre 2% e 3%. Enfim, o aprofundamento das desigualdades parece complicar ainda mais a instituição de uma governança comum.
A falta de vontade política ainda é o maior obstáculo para o resgate do euro. Isso sugere que o forte risco de naufrágio coletivo ainda não foi percebido. A maioria dos governos do bloco parece contar com que os países mais fortes, especialmente Alemanha e França, os que mais teriam a perder com o colapso do euro, paguem a conta. Mas isso pode não acontecer. Nesse caso, a crise do euro pode ter de piorar para só então começar a melhorar.
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