quinta-feira, agosto 25, 2011

CELSO MING - De olho nele


De olho nele
CELSO MING
O ESTADÃO - 25/08/11

Em meio à profunda estagnação da economia americana, os olhares suplicantes se voltam agora para um homem que não recebeu um único voto dos eleitores: ele é Ben Bernanke, o presidente do Federal Reserve System (Fed), o banco central dos Estados Unidos.

Com uma insistência atordoante, querem agora que ele anuncie a utilização da ferramenta monetária capaz de resolver tudo o que outros mecanismos anticrise não foram capazes de fazer.

A expectativa é a de que Bernanke anuncie amanhã, rodeado pelos picos das montanhas rochosas de Jackson Hole (Estado de Wyoming), mais uma super-rodada de afrouxamento quantitativo. Trata-se de uma operação de recompra de títulos do Tesouro americano, que circulam no mercado para que ainda mais dólares prontamente emitidos (os mesmos que foram dados em pagamento pelos títulos) circulem pela economia e acionem o crédito, o consumo, a produção e o emprego.

Por que Jackson Hole? É que lá se realiza todos os anos um fórum que reúne autoridades dos bancos centrais de todo o mundo. Tem sido ocasião para que o presidente do Fed anuncie novidades na política monetária, que reúne os instrumentos pelos quais um banco central tira e põe dinheiro na economia.

Fortes razões sugerem que o mercado está esperando muito do Fed. Mesmo que Bernanke decida injetar ainda mais dinheiro num mercado já abarrotado de recursos, é pouco provável que isso ajude grande coisa.

O Fed já trabalha com juros próximos de zero por cento ao ano. E, como são o preço do dinheiro, juros rastejantes, por si sós, já indicam que há no mercado uma superoferta de recursos. Mais do que isso, o Fed avisou que os juros permaneceriam nesse patamar pelo menos até meados de 2013 - um horizonte mais do que confortável para que qualquer empreendedor possa investir e contratar pessoal.

Além disso, estão circulando no mercado US$ 1,7 trilhão que o Fed injetou na crise de 2007/2008, mais US$ 900 bilhões correspondentes a duas operações de recompra de títulos.

Os bancos americanos já estão atolados em liquidez. Tanto estão que não têm o que fazer com US$ 1,6 trilhão. Em vez de conceder empréstimos, preferem manter essa dinheirama depositada no próprio Fed, a esses juros aí, de até 0,25% ao ano.

Examinadas as coisas pelo lado da procura de crédito nos Estados Unidos, não se vê quadro muito diferente. Os consumidores estão com dívidas até o pescoço - especialmente com compromissos imobiliários -, numa conjuntura em que o valor dos imóveis não para de cair. O empresário, por sua vez, não se anima a levantar dinheiro nos bancos por não pretender investir enquanto o desemprego continuar tão intenso (o que implica estagnação do consumo) e a perspectiva dos negócios estiver mais para o desânimo do que para a virada do jogo.

A única iniciativa que poderia, em princípio, mudar esse quadro seria uma importante redução das dívidas habitacionais, de maneira a abrir um espaço no orçamento hoje apertado do consumidor, para que possa voltar às compras e, assim, movimentar novamente o setor produtivo. Não há nenhuma indicação de que nem Bernanke nem o governo Obama estejam se movendo nessa direção.

CONFIRA

Embora em desaceleração, especialmente no financiamento para compra de veículos, o avanço do saldo das operações de crédito continua forte. Foi de 19,8% em 12 meses terminados em julho. O Banco Central quer que não passe dos 15%.

Crédito caro

Apesar da desaceleração, os juros cobrados nas operações de crédito continuam altos, mostrando algumas quedas pouco expressivas. Para pessoas jurídicas, o crédito para desconto de duplicatas ficou em 42,9% ao ano. E no cheque especial para pessoas físicas, em 188,0% ao ano.

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