sexta-feira, janeiro 28, 2011

AUGUSTO NUNES

O Brasil de cartório sucumbiu ao temporal
AUGUSTO NUNES
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A leitura da certidão de nascimento do Brasil Maravilha, registrada em cartório no dia 15 de dezembro, informa que a tragédia na Região Serrana do Rio só assumiu dimensões apocalípticas porque os brasileiros teimam em morar no país real presidido por Dilma Rousseff. Se vivessem no colosso que Lula inventou, estariam todos na praia ou numa quadra de escola de samba. As tempestades de janeiro não teriam feito mais estragos que uma velha garoa paulistana, as águas dos rios não se atreveriam a abandonar o leito, o mais frágil dos barracos seguiria ancorado na encosta do morro, os mortos seriam contados nos dedos das mãos e os flagelados caberiam numa creche do PAC.

É o que garante a página 278 do segundo dos seis volumes que agrupam os prodígios e milagres colecionados pelo maior dos governantes desde Tomé de Souza. Depois de localizar o trecho que descreve o que Lula fez para mostrar que sabe até domar a natureza, o repórter Bruno Abbud constatou que Dilma anda prometendo coisas que já existem. Há 10 dias, por exemplo, prometeu montar em quatro anos o Sistema Nacional de Prevenção e Alerta de Desastres Naturais. Não precisa. No país do cartório, o Sistema Nacional de Defesa Civil esbanja eficiência desde 17 de fevereiro de 2005.

O decreto-lei 5.376, que transformou o velho Sindec em coisa de primeiro mundo, explica que o órgão ”tem por finalidade: I – planejar e promover a defesa permanente contra desastres naturais, antropogênicos e mistos, de maior prevalência no País; II – realizar estudos, avaliar e reduzir riscos de desastres; III – atuar na iminência e em circunstâncias de desastres; IV – prevenir ou minimizar danos, socorrer e assistir populações afetadas, e reabilitar e recuperar os cenários dos desastres; V – promover a articulação e coordenar os órgãos do SINDEC em todo o território nacional”. Não é pouco. E não é tudo.

O sistema esboçado por Dilma pretende criar um Centro Nacional para Desastres Naturais, com sucursais nas cinco regiões do país, e ”prevê a implantação de sistema operacional de informações hidrológicas, metereológicas, climáticas e ambientais em tempo real, para prevenção e mitigação de desastres naturais”. Perda de tempo, informa o papelório com firma reconhecida. O Sindec já “instalou nas cinco macrorregiões geográficas do brasil as Coordenadorias Regionais de Defesa Civil, ou órgãos correspondentes, responsáveis pela articulação e coordenação do Sistema em nível regional”. Dilma só precisa descobrir onde ficam os prédios e os funcionários.

Precisa também ao padrinho que revele onde está aparato administrativo aperfeiçoado por feitos listados na página 278: ”I - 32.772 agentes capacitados em planejamento e administração para redução de desastres, operações de defesa civil, avaliação de danos, preparação para emergências químicas, formação de núcleos comunitários de defesa civil, dentre outros, em todos os municípios com coordenadorias municipais de defesa civil”; II - 531 cursos diversos de defesa civil realizados em todos os estados brasileiros, 504 obras de prevenção realizadas, tais como as de engenharia em áreas de risco de inundações, deslizamentos, desabamentos, entre outros desastres; III – 35.199 alertas expedidos pelo Centro Nacional de Gerenciamento de Risco e Desastres (Cenad) aos estados e municípios, relacionados a eventos naturais como enchentes, deslizamentos, incêndios florestais, ciclones e vendavais; IV - 190 núcleos comunitários de defesa civil implantados em todas as regiões do Brasil, com apoio da Secretaria Nacional de Defesa Civil (Sedec): V - 2.099 coordenadorias municipais de defesa civil (Comdec) criadas no período de 2003 a 2010, elevando o número de municípios com estes órgãos para 4.299″.

Um sistema de prevenção semelhante a esse evitou que fosse reprisada na Austrália, igualmente devastada por tempestades, a matança ocorrida na Região Serrana. Por que o governo não mobilizou o Sindec para reduzir as dimensões iraquianas do desastre anunciado em 2008 num relatório da ONU? Porque os governantes australianos transportaram para o mundo real o que por aqui só existe na cabeça de pais-da-pátria sem compromisso com a verdade.

“No Brasil, em se plantando, tudo dá”, escreveu Pero Vaz de Caminha na Carta do Descobrimento. A certidão de nascimento do país do faz-de-conta, assinada pelo populista mitõmano e rubricada por ministros sabujos, comprova que Lula se convenceu de vez de que plantar mentira dá voto. Excitado com a colheita de três vitórias presidenciais, mandou empilhar num só documento os embustes, fantasias, invencionices, bazófias e imposturas que plantou. Acabou de descobrir que quem semeia mentiras pode colher tempestades assassinas. No primeiro temporal, o Brasil Maravilha apareceu com água pela cintura.

É só o começo. Vai morrer afogado por chuvas de verdades.

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