quarta-feira, janeiro 12, 2011

ALON FEUERWERKER

Sem czar na economia
Alon Feuerwerker
Correio Braziliense - 12/01/2011
O ex-ministro Delfim Netto costuma ironizar quem trata Economia como ciência exata. Esse tipo de ironia não costuma dar ibope, pois a cena está tomada pelos guardiães do sumo-sacerdócio da autoridade monetária, tratada como entidade acima do bem e do mal.
O instigante é tentar compreender por quê, tendo feito tudo certo, os dirigentes da economia e das finanças trouxeram o país para a atual encalacrada. Que talvez não seja ainda sensível ao cidadão comum, anestesiado pelo real forte. Mas existe.

Segundo o presidente que acaba de deixar o cargo, nossa situação não é menos que espetacular. Na vida real há porém uns probleminhas. Apesar da maior taxa de juros real do planeta, a inflação está aí.

Eis um mistério. Todos os relatos, aqui dentro e lá fora, dizem que somos uma economia em ordem, com as contas públicas institucionalmente disciplinadas, uma autoridade monetária independente e um consenso nacional solidificado em torno do manejo da macroeconomia.

Então por que raios nossos juros estão mais adequados ao último da classe, e mesmo assim funcionam mal? Eis um mistério. A resposta comum joga a culpa no endividamento público. Mas tampouco podemos ser mal classificados nessa categoria.

O Estado brasileiro deve pouco, na comparação. E o aumento da capacidade estatal de investir exigirá mais dívida. Se é legítimo uma empresa endividar-se para alavancar a produção, por que não o governo?

Existe a dívida boa e a dívida ruim. A primeira funciona como multiplicadora de riqueza. Quem não faz dívida é obrigado a vender patrimônio ou a tirar dinheiro de alguém. Não existe almoço grátis.

O problema da dívida pública brasileira não é o estoque, mas a finalidade e o fluxo. A dívida ruim é a feita para cobrir custeio. E juros altos transformam um estoque razoável num fluxo amargo.

Os juros também estão na origem da armadilha do câmbio. O Banco Central e o Ministério da Fazenda têm operado medidas paliativas, cujo estardalhaço no anúncio só é comparável à timidez dos resultados obtidos com elas.

Mas nada disso é novo, ainda que discorrer sobre o cenário seja sempre útil. A novidade agora, pelo menos no cotejo com as duas últimas décadas, é uma presidente da República que se sobrepõe completamente ao czar da economia. Aliás, não há czar da economia no governo Dilma Rousseff.

Se o ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso era indemissível por Itamar Franco,  se Pedro Malan era imexível por FHC, se Antônio Palocci e Henrique Meirelles eram os avalistas do governo Luiz Inácio Lula da Silva diante do onipotente mercado, agora não há figura homóloga.

O que traz duas consequências. Será mais fácil para a presidente trocar auxiliares quando houver falta de desempenho, mas os eventuais problemas caem agora direto na conta da titular.

Muitos e nenhum

Os sinais exteriores são de desarranjo na articulação política do governo. Mas os sinais exteriores podem enganar, pois a política tem destas coisas: tudo parece desarrumado e na hora certa ajeita-se.

Entretanto, assim como na economia, também na política Dilma parece preferir a ausência de blindagem. Pois quem tem mais de um articulador político não tem nenhum.

O real articulador político do governo é sempre o presidente da República. Que costuma indicar um ministro para a área porque precisa de um culpado toda vez que é preciso (ou desejável) dizer "não".

Sobre as circunstâncias do cargo, aliás, ninguém ainda superou na descrição o um dia ministro de Relações Institucionais e hoje ministro do Tribunal de Contas da União José Múcio Monteiro: "Se a vaga de presidente da República está reservada para quem ganha a eleição, o cargo de articulador político deveria ser obrigatoriamente preenchido por quem perdeu. Como castigo."

Conto do vigário

Cresce no PMDB a sensação de ter caído num conto do vigário quando acreditou nas juras de amor eterno lançadas pelo PT antes da eleição. Ou melhor, antes da convenção.

Na prática, o peemedebismo avalia ter recebido um posto quase decorativo (a vice-presidência), perdido espaço na esplanada e reforçado, ao protestar e pressionar, a imagem de sigla de grande apetite.

Fora as ameaças palacianas de contornar os chefes peemedebistas e negociar diretamente com a soldadesca.

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