quarta-feira, março 10, 2010

PAULO RABELLO DE CASTRO


O direito de investir no pré-sal


Folha de S. Paulo - 10/03/2010
 
Devemos permitir que todo participante do FGTS possa adquirir ações da Petrobras, até o que não investiu em 2000

NA SEMANA passada, a Câmara votou a favor da participação do trabalhador-investidor na próxima capitalização da Petrobras, em razão da captação de enormes recursos para a exploração do óleo do pré-sal. Nesta coluna, protestei contra a posição anterior dos deputados que ainda pretendiam excluir o trabalhador do direito de subscrever novas ações. O erro dos parlamentares era elementar: quem já usara seu FGTS para comprar ações em 2000, quando a Petrobras fez uma grande captação em Nova York, permitindo que brasileiros também participassem daqui, tem direito de voltar a investir, até para não ser diluído como investidor.
A matéria segue para o Senado, onde espero que seja aperfeiçoado o dispositivo que faculte aos brasileiros deterem um pedaço da empresa que os políticos afirmam "pertencer ao Brasil". Esse pertencimento tem que ser mais do que uma vaga noção patriótica. Deve se traduzir na posse democratizada dos ativos tangíveis do país.
Essa é uma luta contra os arquétipos escravagistas ainda arraigados em nossa brasilidade exclusivista. Desde Joaquim Nabuco, e antes dele, muito se lutou para que brasileiros fossem detentores, pelo menos, de sua própria vida e liberdade. Hoje, a luta é contra a escravidão econômica: o capital intelectual do país se distribui mal, pela exclusão educacional e digital; o capital imobiliário, pior ainda (o brasileiro mal descobre o direito à propriedade); e o capital acionário está concentrado em poucas mãos.
O FGTS nada mais é que um engenhoso fundo de acesso ao capital social, lançado pioneiramente nos anos 60. Precisa ser modernizado com a aplicação de meios diversificados de fomento ao trabalhador para este começar a investir no capital corporativo.
O Senado deve rever, ampliando seu escopo, o direito de participação dos detentores de FGTS na emissão que capitalizará a Petrobras. Mesmo quem não comprou antes tem o direito de investir agora. Devemos permitir que qualquer participante do FGTS, mesmo não sendo detentor de cota do FMP-Petrobras, possa adquirir ações. Não há razão para excluir o trabalhador que não investiu em 2000. Já esclareci nesta coluna por que a maioria dos trabalhadores de chão de fábrica NÃO utilizou seu FGTS em 2000. Na ocasião, fomos ao encontro de diversos grupos de trabalhadores para esclarecer sobre a boa oportunidade de comprar Petrobras com FGTS. Mas o governo só nos concedeu 20 dias para esclarecer uma ideia tão nova e aparentemente tão perigosa. Resultado: uma minoria adquiriu Petrobras.
É o que os especialistas chamam de "assimetria informacional". Num universo de milhões de contas de FGTS, só 300 mil (os empregados de escritórios, mais informados) investiram. A exclusão persistiu e persiste até hoje. Ainda não houve a esperada democratização do capital produtivo.
Dessa vez, o Senado deve estabelecer um adequado período de disseminação da informação sobre essa oportunidade de investimento. Essa é a grande chance que temos de resgatar o prejuízo histórico no FGTS, do trabalhador que, por décadas a fio, foi tão mal remunerado pela poupança obrigatória que fez. A campanha de esclarecimento pode ainda contar com parceiros privados, como a BM&FBovespa, engajada há tempos na luta por democratizar o capital acionário. É em situações práticas como essa que se mede a real disposição de nivelar as oportunidades de ascensão econômica entre todos os brasileiros.

PAULO RABELLO DE CASTRO , 61, doutor em economia pela Universidade de Chicago (Estados Unidos), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna

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