A força da tradição
O ESTADO DE SÃO PAULO - 15/12/09
Pelo balanço da carruagem, o PMDB vai cumprindo seu destino de sempre: o de servir a dois senhores em épocas de eleição, independentemente de qual seja sua posição em relação ao governo em tela.
No ritmo em que o partido segue, dificilmente será cumprido o acordo prévio com o Palácio do Planalto pela formalização da aliança com a candidatura da ministra Dilma Rousseff.
Isso não significa que a oposição deva se animar, pois é ainda mais remota a possibilidade de o PMDB oficializar uma coligação com o PSDB.
Não porque falte vontade das alas governista e oposicionista para aderir formalmente aos tucanos ou ao PT. O que falta mesmo são condições objetivas de construir uma maioria interna capaz de aprovar a adesão oficial a qualquer dos dois campos que disputam a Presidência da República.
As pistas estão na mesa. A reação irada do PMDB à sugestão do presidente Luiz Inácio da Silva para que o candidato a vice fosse escolhido pelo PT em lista tríplice, a placidez algo entusiasmada com que a direção nacional do partido viu Orestes Quércia ? já acertado com José Serra ? reafirmar seu controle sobre a seção paulista do PMDB com 88% dos votos e uma declaração feita na ocasião pelo presidente do partido, Michel Temer.
Segundo ele, "o PMDB não será ator coadjuvante em 2010, será o ator principal". Ora, isso só ocorre na hipótese de o partido não se atrelar a nenhuma candidatura presidencial de outra legenda. Sendo vice, só assume o papel de protagonista se for para criar problemas ao titular da chapa.
O PT acha que o PMDB blefa.
E, de fato, exagera. Estica o assunto, se faz de ofendido por Lula, posa de vítima de uma "intromissão indevida", como se nunca tivesse se submetido às conveniências do poder nem suportado humilhações em nome de seus interesses.
Quando achou que devia, ouviu calado o senador Jarbas Vasconcelos declarar que o partido era o antro de corruptos. E, em matéria de impertinências por parte do Lula, o partido já ouviu piores. E aguentou quieto.
A maior delas antes mesmo do início do primeiro mandato, quando o ainda presidente eleito desfez na última hora o acerto entre José Dirceu e a cúpula pemedebista para a entrega de dois ministérios à ala que havia se coligado (oficialmente) com José Serra na eleição presidencial de 2002.
O recuo deu-se por pressão do grupo que o havia apoiado na campanha, José Sarney e Renan Calheiros à frente, que queria reinar absoluto no loteamento da administração federal, e por necessidade de abrigar os petistas derrotados.
À época Lula deixou prosperar a versão de que reduzia a participação do PMDB no ministério para diminuir a taxa de fisiologismo como critério para a composição do governo. O gesto foi interpretado ? pela generosidade do entusiasmo com a eleição do "presidente operário" ? como repúdio de Lula a "más companhias".
Nem por isso, a ala rejeitada desistiu. Passou os quatro anos inteiros "provando" ao Palácio do Planalto que eram eles, e não os abrigados no seio governista, que tinham o controle do partido.
Impuseram várias derrotas internas a Sarney e Calheiros e, depois da reeleição, conseguiram se habilitar a entrar no governo oferecendo a Lula apoio na Câmara e maioria mais confortável no Senado. Sem remoer mágoas do passado.
Apenas mediante a celebração de um acordo de sete pontos firmado logo depois da eleição, em novembro de 2006.
A ideia era convencer as pessoas de que a adesão não se baseava na troca de apoio por cargos, mas em um compromisso "programático".
Nele, o PMDB exigia o seguinte: reformas política e tributária, crescimento econômico acima de 5%, contenção dos gastos correntes, consolidação das políticas de transferência de renda, renegociação das dívidas dos Estados, fortalecimento da Federação e acompanhamento das ações de governo por parte de um conselho político formado por presidentes dos partidos da coalização governista.
À exceção das políticas sociais, de interesse do próprio governo, tudo o mais foi ignorado e o PMDB não tugiu nem mugiu.
Se o faz agora com virulência e insistência é porque anda à caça de um pretexto para justificar a impossibilidade de entregar a mercadoria que prometeu.
Bênção coletiva
O presidente do Senado, José Sarney, encerrou o primeiro semestre do ano contestado por boa parte de seus pares, que defendiam reformas na Casa e sua saída do cargo.
O presidente do Senado encerra o ano sem modificar nada na estrutura que causou escândalo nacional e perfeitamente aceito pela totalidade de seus pares, que tampouco contestam a quebra das mudanças prometidas.
De onde se conclui que aquela indignação era falsa e que a intenção do colegiado nunca foi mudar nada. Mais grave: Sarney firmou-se exatamente pela condição de perfeito guardião da estrutura deformada, mas que serve na medida aos interesses em jogo na Casa.
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