O clima de euforia e a arrogância podem nos impedir de enxergar coisas que ainda têm de ser feitas com urgência A EXTENSA reportagem da revista "The Economist" da semana passada, que saudou em 14 páginas a decolagem brasileira no cenário mundial, tinha um erro. Informava que a Independência do Brasil ocorreu 1825. Tirando esse escorregão, o material jornalístico e o editorial principal da revista foram bastante elogiosos sobre o momento vivido pelo país, que seria, "ipsis litteris", o melhor "desde que um grupo de navegadores portugueses (procurando pela Índia) acabou batendo na costa brasileira, em 1500". Mas, em meio a elogios como esse, o texto tem o mérito de levar a reflexões sobre a fase de euforia vivida pelo país. O maior risco que o Brasil corre, diz a publicação, é se deixar levar pelo que os ingleses chamam de "hubris", ou, em bom português, "arrogância". A observação é correta. O clima de euforia e a arrogância podem nos impedir de enxergar coisas que, a despeito dos avanços indiscutíveis, ainda precisam ser feitas com urgência no país. Há um número razoável de problemas, cuja solução exige persistência e determinação. O mais urgente é o do câmbio. Dez entre dez economistas acham que o real está supervalorizado e que isso pode fazer estragos consideráveis na economia brasileira. Só neste ano, a moeda teve valorização de 30% ante o dólar, com efeitos dramáticos para a receita das empresas exportadoras. Não dá mais para aceitar a explicação jocosa de que o dólar flutua porque é flutuante. Algumas medidas tomadas para atenuar o problema cambial, como a taxação de IOF nos investimentos financeiros, foram insuficientes. Certamente, a flutuação é uma característica do câmbio flutuante. Mas não se pode confundir dólar flutuante com dólar "submergente". Enquanto o dólar derrete em relação ao real, os juros internos continuam sendo mantidos entre os mais altos do mundo, a despeito da inflação controlada. Só a teimosia pode explicar essa situação, que ajuda a valorizar o real. Não existe rigorosamente nenhum empecilho à adequação das taxas às praticadas em outros países. Euforia e arrogância também podem nos impedir de enxergar problemas cruciais remanescentes na infraestrutura do país. As deficiências do setor de transportes, por exemplo, muito dependente do sistema rodoviário, não só infernizam a vida nas grandes cidades como comprometem o escoamento da produção. Os investimentos que estão sendo feitos nessa área são insuficientes para sustentar uma nova fase de crescimento da economia. A competitividade do país, prejudicada por custos da infraestrutura precária, também é comprometida pelos excessivos encargos que recaem sobre os salários. Há uma arcaica legislação trabalhista à espera de reformas. Outra chaga brasileira é a criminalidade -cerca de 50 mil pessoas são assassinadas por ano no país. Os leitores habituais deste espaço, nas terças-feiras, sabem do entusiasmo com que exalto os valores e as conquistas nacionais. Sem um pouco de nacionalismo sadio, não é possível construir nenhuma nação. Continuo extremamente otimista com a chance que se apresenta para que o Brasil se transforme, nas próximas décadas, em um país moderno e próspero. Mas, como recomenda a "The Economist", esse caminho exige que os brasileiros se dispam da arrogância e enfrentem com coragem as deficiências que ainda ameaçam a expansão sustentada da economia e a melhoria da renda da população. |
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